A guerra comercial e tecnológica entre EUA e China em Trump e Biden

In this combination photo, president Donald Trump, left, speaks at a news conference on Aug. 11, 2020, in Washington and Democratic presidential candidate former Vice President Joe Biden speaks in Wilmington, Del. on Aug. 13, 2020. The conventions, which will be largely virtual because of the coronavirus, will be Aug. 17-20 for the Democrats and Aug. 24-27 for the Republicans. (AP Photo)

por Neusa Maria P. Bojikian e Rúbia Marcussi Pontes, pesquisadoras do INCT-INEU (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos)

Na chegada de Joe Biden e de seu pessoal à Casa Branca, não se notou o alívio ao persistente estado de hostilidade verificado durante os anos de Donald Trump nas relações sino-americanas. A primeira reunião entre as partes, ocorrida em18 de março do corrente ano, na fria Anchorage (Alasca), foi protagonizada por Anthony Blinken, secretário de Estado, e Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, que se reuniram com Yang Jiechi, principal conselheiro de política externa do presidente Xi Jinping, e Wang Yi, ministro das Relações Exteriores da China. Representou-se uma espécie de concurso de olhar fixo, em que uma parte tenta manter contato visual por um período mais longo do que o de seu oponente. A propósito, o jogo termina quando um lado pisca, ou desvia o olhar.

As autoridades chinesas contra-atacaram a abordagem admoestatória do secretário Blinken, que disse que os Estados Unidos tratariam das “profundas preocupações” sobre Xinjiang, Hong Kong e Taiwan, e destacou que a China teria realizado ataques cibernéticos aos Estados Unidos e praticado coerção econômica contra os aliados norte-americanos.

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O alto diplomata Yang, na posse da bola, por assim dizer, e sabendo que a janela de oportunidade se fecharia rapidamente, adotou seu próprio tom acusatório, chamando atenção para a forma como os Estados Unidos têm lidado com os ataques internos à democracia e para o tratamento dispensado às minorias, além da forma como o país tem conduzido as políticas externa e comercial. As autoridades chinesas que já vinham incomodadas com as advertidas públicas do secretário Blinken e do conselheiro Sullivan, bem como com o anúncio de imposição de sanções contra as autoridades chinesas por causa da reforma do sistema eleitoral de Hong Kong, em Pequim, adotaram uma abordagem dura nesse início de interação com o time de Biden.

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O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, em novembro de 2020 (Foto: Wikimedia Commons)

As comparações dessas abordagens com aquelas da administração Trump parecem inevitáveis. Alguns especialistas apontaram que, mesmo durante os períodos de maior atrito da gestão anterior, não houvera tal exibição pública de contenção. Isso nos remete à questão: as táticas, especificamente aquelas relativas às barreiras tarifárias e às barreiras sobre investimentos chineses, usadas pelo governo Trump, serão replicadas pelo governo Biden? É cedo para afirmar. O perfil do jogo inicial da equipe de Biden, continuando a fazer uso das metáforas esportistas, pode ter sido um teste. Os lados podem ter desejado testar o poder de contra-ataque e táticas de finalização um do outro para depois, eventualmente, fazer os ajustes necessários.

Como abordamos no Seminário: O Governo Trump, as Eleições de 2020 e a Crise na Política Norte-Americana, a administração Trump, bastante ao modo voluntarioso do próprio então presidente, defendia políticas orientadas pelo objetivo de preservar a primazia dos Estados Unidos de uma posição de força, em que os interesses do país deveriam ser contemplados e postos em primeiro lugar.

Cético em relação às vantagens que organizações e arranjos multilaterais trariam, Trump defendia o corte da participação dos Estados Unidos em tais instituições, como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que na sua avaliação custava caro ao país, bem como defendia uma dinâmica bilateral na renegociação de acordos existentes.

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Tal postura se cristalizou ao longo de seu mandato, com Trump rescindindo os compromissos dos Estados Unidos frente a uma série de acordos e organizações multilaterais, como o Acordo de Paris, o Acordo do Irã, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e a Organização Mundial da Saúde (OMS), e renegociando acordos comerciais, com destaque para o USMCA, acordo às vezes chamado NAFTA 2.0, e para o acordo com a Coreia do Sul. Seu objetivo seria reverter termos e condições que teriam prejudicado os interesses estratégicos e econômicos do país.

China: o alvo principal do sentimento urgente de desforra política

Um sentimento de desforra política muito maior guiou as abordagens em relação à China, que passou a ser fortemente percebida como um Estado revisionista e, cada vez mais, como uma ameaça aos Estados Unidos. Em campanha eleitoral, Trump se aferrou no discurso de que os Estados Unidos perdiam empregos na indústria manufatureira e espaços econômicos, nos mais diversos setores, para a China, e prometeu que reverteria as principais decisões que haviam marcado a administração Obama. Uma vez eleito, arrastou a China para a mesa de negociação tentando, a seu modo, fazer as autoridades chinesas cederem às suas posições.

Nesse contexto, identificam-se inúmeras declarações públicas, tanto de Trump quanto de representantes do alto escalão de sua administração, como Wilbur Ross, então secretário de Comércio, Robert Lighthizier, que ocupava o posto de Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR, da sigla do inglês), Steven Mnuchin, então secretário do Tesouro. Identificam-se também inúmeras ações do Executivo com destaque para as Ordens Executivas (OEs), os relatórios do Departamento de Comércio e do USTR, que buscavam enquadrar a China como violadora das regras comerciais e adepta do chamado “comércio injusto” e, assim, reconfigurar as bases da competição.

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A propósito, Trump operou amplamente por meio de OEs, que dispensam a aprovação do Congresso para entrar em vigência, contribuindo para evidenciar seu perfil impulsivo. Note-se que, se comparado a outros presidentes com dois mandatos, Trump se valeu mais desse tipo de instrumento. Teria superado seus predecessores, se tivesse sido reeleito e continuasse no mesmo ritmo.

Dentre essa extraordinária quantidade de OEs, podem-se destacar: a OE 13786, de março de 2017, que aponta assimetria comercial em desvantagem dos Estados Unidos e pede que o USTR elabore um relatório, em 90 dias, identificando os parceiros comerciais críticos do país e medidas necessárias; a OE 13873, de maio de 2019, que denuncia como adversários externos estariam constantemente explorando e criando vulnerabilidades aos serviços e tecnologias de comunicação e de informação dos Estados Unidos, e que enquadra tais práticas em roubo e em espionagem cibernética; a OE 13859, de fevereiro de 2019, que acusa a necessidade de garantia da liderança dos Estados Unidos em Inteligência Artificial e em pesquisa e desenvolvimento como essenciais às seguranças econômica e estratégica do país; e as OEs 13942 e 13943, de agosto de 2020, que declararam situação de emergência nacional e a necessidade de rever a atuação de empresas chinesas nas comunicações, com destaque para o banimento do TikTok e do WeChat.

As batalhas comerciais e as miradas contra a China

As ações executivas citadas acima instruíram várias frentes de investigações que serviram de base para a emergência da guerra comercial dos Estados Unidos, sob Trump, com o mundo, mas sobretudo com a China. A guerra envolveu várias batalhas, e cada batalha se amparou em um determinado fundamento jurídico dos Estados Unidos. Chad P. Bown e Melina Kolb mantêm um blog com um detalhado registro da sucessão dos fatos, ou, como eles preferem chamar, das múltiplas batalhas. Vale a pena ser consultado.

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Uma das batalhas se serviu da Seção 201 da Lei de Comércio de 1974 para justificar a imposição de tarifas de salvaguardas sobre painéis solares e máquinas de lavar. A China revidou o movimento inesperado da administração Trump, anunciando o estabelecimento de direitos antidumping sobre as importações de sorgo dos Estados Unidos. Na sequência, anunciou uma ação no Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC) contra tarifas de painéis solares, alegando que as tarifas dos Estados Unidos prejudicaram os interesses comerciais da China.

Uma outra batalha se baseou na Seção 232 da Lei de Expansão Comercial de 1962, que permite que tarifas sejam impostas em nome da segurança nacional. Esta batalha se estabeleceu com o anúncio da administração de Trump sobre futuras tarifas de 25% sobre aço e 10% sobre alumínio importados. Nessa batalha, a China não foi o país mais afetado. Na verdade, os aliados, como os parceiros do NAFTA (Canadá, México), Coreia do Sul e União Europeia foram os mais atingidos. Contudo, já aborrecida pelos efeitos das barreiras anteriores, Pequim respondeu impondo tarifas sobre resíduos e sucata de alumínio, carne de porco, frutas e nozes, além de outros produtos dos Estados Unidos, no valor US$ 2,4 bilhões (valor correspondente à exportação em 2017). Esse montante seria a resposta às tarifas de aço e alumínio dos Estados Unidos sobre as exportações chinesas no valor de US$ 2,8 bilhões em 2017.

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Encontro entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o presidente chinês, Xi Jinping, em Osaka, no Japão. Junho de 2019 (Foto: The White House/Shealah Craighead)

Neste conjunto de imposições estabelecidas pela administração Trump, podem-se destacar também os subsídios de US$ 12 bilhões anunciados aos fazendeiros dos Estados Unidos como forma de compensação por perdas de vendas, resultantes, por sua vez, das barreiras tarifárias anteriores sobre produtos chineses. Para tanto, a administração Trump recorreu a uma lei que apoiou os agricultores durante a Grande Depressão.

Não satisfeito, em janeiro de 2020, o governo Trump impôs novas tarifas sobre quase US$ 450 milhões em produtos de aço e alumínio para ajudar as indústrias domésticas. A China, assim como Taiwan, Japão e União Europeia, foi atingida.

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A China na mira da Seção 301

Em uma outra série de contendas, estas embasadas pelas conclusões das investigações comerciais com base na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 (e seus aditivos), sob o comando do USTR, o alvo foi exclusivamente a China. Os achados do USTR apontaram para uma situação que seria extremamente desequilibrada para empresas dos Estados Unidos que operavam na China. Em tese, o governo chinês recorria à regulamentação doméstica para obrigar tais empresas a ceder tecnologia em investimentos por meio de joint-ventures, de contratos de licenciamento e de outros tipos de parceria com empresas chinesas, subsídios a empresas es tatais. Além disso, o USTR teria encontrado evidências de práticas de roubo de propriedade intelectual, de informações secretas e espionagem industrial chinesa, nos Estados Unidos, por meio de invasões em redes de computadores.

Tais acusações, traduzidas nas recorrentes alegações de práticas comerciais desleais atinentes à transferência de tecnologia, propriedade intelectual e inovação, levaram a administração Trump a indicar a imposição de novas tarifas sobre produtos chineses, abertura de painéis de reclamações na OMC e a imposição de novas regras de investimento.

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Uma soma de US$ 50 bilhões foi o anunciada como objeto de novas barreiras tarifárias. Tal soma correspondeu inicialmente a 1.333 produtos chineses, sobre os quais seriam aplicadas tarifas de importação de 25%. Os principais setores atingidos são máquinas, aparelhos mecânicos e equipamento elétrico. Cerca de 85% das importações sujeitas às novas tarifas correspondem a insumos intermediários e bens de capital.

Sem se intimar, a China ameaçou retaliar, mirando automóveis, aeronaves, embarcações e agricultura. Uma lista contendo 106 produtos sujeitos a tarifas de 25% somava igualmente US$ 50 bilhões de importações originárias dos Estados Unidos. Depois de ataques e contra-ataques, em que as respectivas listas foram refeitas para se atingir de forma mais aguda os correspondentes alvos, o USTR foi novamente instruído a identificar um valor adicional de US$ 200 bilhões em produtos chineses, sobre os quais seriam aplicadas tarifas adicionais no patamar de 10%. Além disso, ameaçou estabelecer outros US$ 200 bilhões de tarifas, se a China retaliasse novamente.

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Em julho de 2018, os anúncios sobre as barreiras tarifárias começaram a sair dos papéis de ambas as partes. As tarifas dos Estados Unidos sobre US$ 34 bilhões de importações chinesas entraram em vigor, assim como as tarifas da China sobre US$ 34 bilhões de importações dos Estados Unidos. Além disso, Trump declarou que estava pronto para impor tarifas sobre todas as importações vindas da China, que totalizaram US$ 504 bilhões em 2017. Fora os produtos que já haviam sido listados anteriormente, bens de capital e produtos de consumo, como telefones celulares, laptops e vestuários, seriam os novos alvos. A segunda fase da implementação das tarifas correspondente ao pacote de US$ 50 bilhões, portanto os US$ 16 bilhões restantes, foi implementada em agosto de 2018, ato que foi imediatamente respondido pela China, que impôs suas próprias tarifas revisadas sobre US$ 16 bilhões das exportações dos Estados Unidos.

Seguindo a orientação de Trump, o USTR declarou que estava considerando uma tarifação de 25%, e não mais de 10%, sobre a lista de US$ 200 bilhões anteriormente divulgada. A China rebateu, ameaçando adicionar taxas de 5% a 25% sobre US$ 60 bilhões em produtos dos Estados Unidos. Ameaças de majoração foram às vias de fato, com os Estados Unidos impondo tarifas de 10% sobre US$ 200 bilhões de importações chinesas em setembro de 2018, e com a China impondo tarifas que variaram de 5% a 25% sobre US$ 60 bilhões de importações dos Estados Unidos.

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Depois de mais uma série de ameaças e em uma mudança repentina de curso das negociações comerciais entre os dois países, foi anunciado que os Estados Unidos iriam aumentar a tarifa de 10% para 25% sobre US$ 200 bilhões de importações da China em maio de 2019. A administração Trump também indicou, mais uma vez, que iria impor tarifas de 25% sobre o resto das importações vindas da China ainda não alvo de suas tarifas da Seção 301. Com isso, atingiria uma gama de produtos de consumo no país, tais como brinquedos, calçados, vestuário e eletrônicos. A retaliação da China chegou imediatamente, com a entrada em vigência das tarifas da China sobre as exportações dos Estados Unidos sobre US$ 36 bilhões da lista de US$ 60 bilhões de setembro 2018. Uma outra forma de punição por parte da China se verificou no fato de que a China reduziu a margem tarifária cobrada sobre importações de outros países concorrentes, provocando ainda mais ímpeto na administração Trump.

Em um jogo do tipo tit for tat, o ano de 2019 terminou com a administração Trump cancelando o aumento tarifário programado para 15 de dezembro e indicando que as partes haviam chegado a um acordo, que deveria ser assinado em janeiro de 2020 – o que de fato aconteceu. Tal acordo encerraria a escalada das disputas comerciais, em que os Estados Unidos chegaram a anunciar a imposição de barreiras tarifárias sobre uma soma de US$ 550 bilhões de produtos chineses. A China, por sua vez, retaliou com tarifas sobre valor de aproximadamente US$ 185 bilhões de produtos dos Estados Unidos.

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O presidente da China, Xi Jinping, na Assembleia-Geral da ONU de 2017 (Foto: Cia Pak/UN Photo)

Sob a primeira fase do acordo, a China se comprometeu a comprar a quantia adicional de US$ 200 bilhões dos Estados Unidos, mas a maioria das tarifas já estabelecidas permaneceu em vigor. As tarifas médias dos Estados Unidos sobre as importações da China permanecem acima de seis vezes mais altas do que aquelas vigentes antes do início da guerra comercial em 2018. E, para o descontentamento dos Estados Unidos, as tarifas médias chinesas diminuíram apenas discretamente. Uma outra questão que acabou deixando os Estados Unidos irritados foi o fato de a China não ter acordado com regras sobre empresas estatais. Além disso, diante de incertezas trazidas pela pandemia, as compras adicionais, com as quais a China se comprometera (US$ 200 bilhões acima do nível importado em 2017), não foram efetuadas em 2020.

Em uma outra frente de batalha com a China, os Estados Unidos procuraram salvaguardar a supremacia de sua indústria de semicondutores. Conforme Chad P. Bown definiu: “semicondutores são minúsculos chips – os onipresentes circuitos integrados e microprocessadores – que conduzem tudo, de smartphones a hardware de telecomunicações, computadores, automóveis, data centers e sistemas de armas”. E, como o autor corretamente destacou, a fabricação de chips envolve uma imbrincada cadeia global de suprimentos, com dezenas de empresas profundamente unidas e interdependentes.

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Em março de 2017, a empresa chinesa de telecomunicações ZTE foi condenada a pagar multa de US$ 1,19 bilhão, imposta pelo Escritório de Indústria e Segurança (BIS, da sigla em inglês) do Departamento de Comércio, que a acusou de ter comercializado determinadas tecnologias com o Irã e com a Coreia do Norte. Um ano depois, a mesma empresa foi alvo de novas sanções, ficando impedida de comprar componentes de empresas dos Estados Unidos. Na sequência, um acordo foi selado de modo que, se a ZTE pagasse a multa bilionária e concordasse em ser monitorada pelo BIS por dez anos, para se ter certeza de sua conformidade com os controles de exportação do país, poderia voltar a operar regularmente.

Outra iniciativa que merece destaque neste conjunto de contendas e também está ligada à batalha travada sob o manto da Seção 301 foi a sanção da lei John S. McCain National Defense Authorization Act for Fiscal Year 2019, que exige que sejam identificadas “tecnologias emergentes e fundamentais” para a segurança nacional dos Estados Unidos, as quais devem estar sujeitas a controles de exportação. Isso quer dizer que a lei exigiu o monitoramento de determinados investimentos estrangeiros nos Estados Unidos (Lei de Modernização de Revisão de Risco de Investimento Estrangeiro de 2018, FIRRMA, da sigla em inglês) e transferências de tecnologia (Lei de Reforma do Controle de Exportação de 2018, ECRA, da sigla em inglês). Tais disposições alteram a interseção entre a segurança nacional e a economia nos Estados Unidos.

Em janeiro de 2019, foi a vez da empresa chinesa de telecomunicações Huawei enfrentar o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que a acusou de uma série de crimes: fraude financeira, lavagem de dinheiro, conspiração para fraudar os Estados Unidos, obstrução da Justiça e violações de sanções. Com isso, o Departamento de Comércio restringiu o acesso da Huawei a itens produzidos nos Estados Unidos, exigindo que a empresa obtenha antes uma devida licença. A restrição abrangeu subsidiárias da Huawei no exterior, incluindo Reino Unido, Alemanha, França e Singapura e fechou um cerco em torno da empresa, que se viu proibida de adquirir produtos de empresas dos Estados Unidos. Em maio de 2020, o Departamento de Comércio alterou sua regra de Produto Direto Produzido no Exterior (FDP, da sigla em inglês) e sua lista de empresas com restrições de acesso a produtos dos Estados Unidos, impedindo que a Huawei adquira software e tecnologia usada na fabricação de semicondutores de companhias estrangeiras.

Em agosto de 2020, mais uma alteração foi feita sobre a regra FDP, restringindo ainda mais o acesso da Huawei a semicondutores. A regra determina as mesmas restrições de licenciamento a semicondutores desenvolvidos fora dos Estados Unidos que usam software, ou tecnologia, dos Estados Unidos como aqueles fabricados nos Estados Unidos.

As relações sino-americanas nos crepúsculos ocidentais

Trump e seu pessoal partiram da Casa Branca, deixando os rastros de ataques retóricos ferozes e de anúncios frequentes de sanções, muitas delas de fato implementadas, contra a China. O acordo bilateral assinado no início de 2020 não trouxe a estabilidade esperada pelos agentes econômicos, preocupados com o impacto da guerra comercial e tecnológica comandada por Trump sobre as cadeias produtivas em nível mundial. No apagar das luzes, o antagonismo em relação à China recrudesceu, com Trump e outros membros de sua administração acusando aquele país de criar o “vírus chinês”, que causou a pandemia e a crise mundial, e tentando bloquear o funcionamento de alguns aplicativos chineses, como o TikTok e o WeChat, com base em alegações de segurança nacional.

Na chegada de Biden e de seu time, entretanto, o quadro de interrogações não se alterou. Eles estão chegando em meio a uma dispersão da luz sobre a camada de impurezas e de desordem que cobre o mundo. Embora tenham interrompido a abordagem impulsiva à qual estávamos assistindo, não recuaram em nenhuma das ações de seus predecessores. Além disso, a rodada de negociações ocorrida no Alasca, entre 18 e 19 de março, envolvendo o alto escalão dos respectivos governos, não resultou em avanços no relacionamento diplomático. Ainda que não houvesse grandes expectativas e já se pudesse esperar que Biden manteria uma linha dura com a China, a fim de imprimir uma marca oposta àquela de negociador concessivo diante de uma China “revisionista”, o encontro foi marcado por reprimendas mútuas.

A alta cúpula da administração Biden sinalizou que responsabilizará Pequim por “seus abusos”, não apenas nos temas de direitos humanos, direitos ambientais, segurança internacional, mas também nos temas econômicos e, certamente, em relação aos investidores. Procurando manter distância do lema “América Primeiro” de Trump, o secretário Blinken quis legitimar o discurso oficial da administração Biden. Falou em nome de um coletivo – os aliados –, ao dizer que os Estados Unidos estão preocupados com os ataques cibernéticos e com a “coerção econômica” contra estes mesmos parceiros e sócios e defendendo os regimes internacionais: “cada uma dessas ações ameaça a ordem baseada em regras que mantém a estabilidade global. É por isso que não são meramente questões internas e por isso nos sentimos na obrigação de levantar essas questões aqui hoje”.

As autoridades chinesas, por sua vez, ainda que procurando comunicar que preferem investir na manutenção de um relacionamento estável, sem os solavancos de Trump, sinalizaram que estão posicionadas para resistir aos empurrões e caneladas do time dos Estados Unidos, sejam em termos de pressão política, sejam em forma de batalhas econômico-comerciais.

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