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Moçambique/Sociedade: Cratera em Pemba ameaça casas e famílias deslocadas, porque permanecem as autoridades em silêncio?

Moradores de Mahate vivem entre a lembrança da guerra e o risco iminente de perderem tudo para a erosão, enquanto aguardam respostas concretas das autoridades locais e nacionais.

Como não temos condições, estamos a viver assim mesmo”, desabafa Sofia Gabriel Mussa, 36 anos, residente no bairro de Mahate, junto à Estrada Nacional 1 (N1). A poucos metros do asfalto, uma vala com 50 metros de profundidade e meio quilómetro de extensão ameaça engolir casas inteiras e cortar a principal via que liga Pemba ao resto do País. Sempre que chove, a água é arrastada para a baía da cidade, afastando ainda mais as habitações.

Pedimos ajuda, que essa cova se recupere (…). Pôr pedras, fazer uma valeta para a água passar para lá, para a praia. É a ajuda que toda a população está a pedir”, insiste.

Camponesa e mãe de sete filhos, o mais novo de apenas três meses, Sofia fugiu de Macomia para Pemba após um ataque de insurgentes na sua aldeia, há três anos. Nesse dia, viu o irmão ser decapitado pelos atacantes quando colhia arroz no campo. “Problema de guerra. Atacaram, entraram. Mataram, e muita gente está aqui”, recorda.

Quando chegou ao bairro, a fenda era “pequena”, mas desde 2023 não parou de crescer, colocando em risco também um estaleiro empresarial que, a expensas próprias, tenta conter a erosão. “Temos muito medo. No ano passado caiu uma criança, que encontrámos desmaiada no fundo”, lembra Sofia, acrescentando que a cada época chuvosa “a cova aumenta”.

A Administração Nacional de Estradas (ANE) estima em 100 milhões de meticais (1,3 milhões de euros) o custo para travar a cratera, sob risco de isolar a cidade de Pemba. O governador de Cabo Delgado, Valige Tauabo, reconheceu as dificuldades financeiras, mas prometeu uma intervenção antes do início das chuvas, recorrendo ao uso de pedras para travar a erosão.

Até lá, restam apenas promessas. Sofia, escolhida como chefe de dez casas no bairro, aponta para o vazio onde antes havia habitações: “Aqui tinha uma casa, ali tinha uma casa, já se foi”.

O medo, porém, não a leva de volta a Macomia: “Tenho muitas crianças pequenas e por isso tenho medo”.

O drama é partilhado por Samuel Matias Tomás, 19 anos, que fugiu de Mocímboa da Praia em 2017 após perder o irmão num ataque terrorista. Em 2024, ergueu casa em Mahate com a família de 11 pessoas. “No tempo chuvoso muitas casas caíram. Estamos a pedir ajuda, pelo menos uma valeta”, apela.

Muitas pessoas perderam a vida aqui (…) Tenho muito medo”, acrescenta, admitindo não ter para onde ir. “Não temos maneira de sair. Não temos nada. Voltar para Mocímboa da Praia não está em causa, tenho medo”.

Entre os que partilham o receio está também Anifa Sufo, 22 anos, deslocada com marido e três filhos. Vê as crianças transformarem a fenda em escorrega improvisado e assume: “Estamos a sentir medo com essa cova. De alguém cair, mesmo as crianças”.

O perigo não é novo. Atimo Ausse Ibraimo, 41 anos, nascido no bairro, recorda que o problema começou há cerca de 15 anos, mas agravou-se nos últimos meses. “Aqui havia casas há muito tempo, já não há. A cova está a andar e vai destruir todas as nossas casas”, alerta, contabilizando pelo menos seis casas já perdidas.

Caminhos antes diretos ficaram interrompidos pela erosão. Para visitar os primos, Atimo precisa agora de andar dez minutos estrada fora. “Estamos a pedir ajuda”, repete, num apelo comum a todos os moradores de Mahate, que temem que a próxima época das chuvas transforme a cratera numa tragédia inevitável.

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