« A não ser que comecemos a ver reformas económicas significativas que encorajem a distribuição dos benefícios do gás a toda a economia, Moçambique poderá enfrentar os mesmos problemas que limitaram o crescimento em países como Angola ou Nigéria durante a recente queda do preço das matérias primas », escrevem os analistas da Fitch Solutions.
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Na mais recente análise a longo prazo da economia do país, enviada aos investidores e a que a Lusa teve acesso, os peritos desta consultora detida pelos mesmos donos da agência de notação financeira Fitch Ratings lembram que « várias estimativas apontam para a existência de entre 100 a 185 biliões de pés cúbicos na costa do país, mais do que o total do consumo nos Estados Unidos durante duas décadas ».
Isto, afirmam, « vai originar uma transformação da economia, com mais crescimento, maiores exportações e avultadas receitas, para além de maiores e mais atrativas oportunidades de negócio para os investidores estrangeiros ».
Só que, acrescentam, « com o país incapaz de aprovar grandes reformas estruturais para transformar a riqueza dos recursos numa economia diversificada e com padrões de vida mais elevados para as populações, Moçambique arrisca-se a cair na mesma armadilha das matérias primas que prejudicou o crescimento em várias economias dependentes dos recursos naturais, limitando as oportunidades nos outros setores ».
Em causa estão os exemplos de Angola e da Nigéria, que têm um modelo económico que depende fortemente das exportações: « independentemente da riqueza e do crescimento real do PIB que um aumento do gás poderia trazer à economia de Moçambique, os exemplos de Angola e da Nigéria revelam um abrandamento dramático do crescimento das exportações no seguimento do colapso dos preços em 2015 e 2016 ».
Se o gás desempenhar um papel semelhante, « a economia vai ficar exposta aos mesmos riscos, com a volatilidade nos preços globais do gás a resultar provavelmente em grandes e súbitas variações nas receitas externas », alertam.
Para evitar um destino semelhante ao dos dois maiores produtores de petróleo na região, a Fitch Solutions diz que será preciso « que o Governo implemente várias reformas para promover métodos alternativos de crescimento económico quando os preços desçam, mas isto é uma perspetiva desafiante na região, e no caso de Moçambique estamos particularmente céticos sobre a capacidade do Governo em implementar este tipo de reformas devido ao histórico recente de má governação ».
A expectativa da Fitch Ratings é que « as perspetivas económicas melhorem durante a próxima década, à medida que o progresso nos projetos de gás natural oferece um empurrão significativo ao crescimento a longo prazo », isto depois de o PIB se ter contraído 1,3% no ano passado devido à pandemia de covid-19.
Durante esta década, no entanto, o panorama poderá ser diametralmente oposto: « Quando as exportações começarem, que esperamos aconteça a partir de 2022, antevemos uma aceleração da atividade económica, o que significa que Moçambique poderá ter uma das mais elevadas taxas de crescimento da África subsaariana », preveem os analistas.
Isto, claro, se a situação de segurança no norte do país, onde estão as maiores reservas de gás desta região, melhorar, já que atualmente os combates são « uma ameaça significativa ao desenvolvimento do setor do gás natural liquefeito e à atratividade de investidores estrangeiros ».
A Fitch Solutions, de resto, avisa que « sem um progresso mais significativo na luta contra os insurgentes, os riscos de ataques diretos aos locais dos megaprojetos vão aumentar a médio e longo prazo ».