MozLife

Internacional/Médio-Oriente: Reconhecer o Estado da Palestina: qual o verdadeiro impacto e significado para o conflito no Médio Oriente?

O Primeiro-Ministro Keir Starmer promete reconhecer a Palestina até setembro, a menos que Israel aceite um cessar-fogo em Gaza e retome o processo de paz para uma solução de dois Estados

O Primeiro-Ministro britânico, Sir Keir Starmer, anunciou que o Reino Unido está pronto para reconhecer oficialmente o Estado da Palestina até setembro, caso Israel não satisfaça certas exigências, nomeadamente um cessar-fogo imediato em Gaza e o compromisso com a solução de dois Estados.

A resposta do Primeiro-Ministro israelita, Benjamin Netanyahu, foi imediata e contundente, acusando Londres de “recompensar o terrorismo monstruoso do Hamas”.

Mas o que realmente implica este reconhecimento e que impacto poderá ter na prática?

O que significa reconhecer o Estado da Palestina?

A Palestina é, simultaneamente, um Estado que existe e não existe.

Dispõe de amplo reconhecimento internacional, missões diplomáticas no estrangeiro e participa em competições desportivas como os Jogos Olímpicos. Contudo, não tem fronteiras oficialmente reconhecidas, capital nem exército. A Autoridade Palestiniana, estabelecida após os acordos de paz dos anos 90, não controla totalmente o território da Cisjordânia, devido à ocupação militar israelita. Já Gaza encontra-se em guerra, sob cerco militar de Israel.

Neste contexto, o reconhecimento é sobretudo simbólico, traduzindo uma declaração política e moral forte, mas com pouco impacto direto no terreno.

Ainda assim, o simbolismo é poderoso. Como referiu o Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, David Lammy, num discurso nas Nações Unidas: “A Grã-Bretanha tem uma responsabilidade histórica especial para apoiar a solução de dois Estados.”

Lammy evocou a Declaração Balfour de 1917, assinada pelo então chefe da diplomacia britânica, Arthur Balfour, que expressava apoio à criação de “um lar nacional para o povo judeu na Palestina”. Mas recordou também que essa declaração incluía uma promessa solene de não prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não judaicas já existentes na região.

Um dossiê inacabado da história internacional

Os defensores de Israel apontam que a Declaração Balfour não mencionava explicitamente os palestinianos nem os seus direitos nacionais. A Palestina, sob mandato britânico entre 1922 e 1948, permanece um assunto não resolvido na arena internacional.

Israel foi criado em 1948, mas os esforços para estabelecer um Estado palestiniano paralelo falharam repetidamente.

A ideia de “solução de dois Estados” — com a criação de uma Palestina independente na Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Faixa de Gaza — tem sido reiterada, mas raramente aplicada. A expansão israelita em zonas da Cisjordânia, considerada ilegal pelo direito internacional, esvaziou a proposta de conteúdo real.

Reconhecimento internacional da Palestina: quem está ao lado?

Atualmente, 147 dos 193 Estados-membros da ONU reconhecem o Estado da Palestina. Na organização, detém o estatuto de “Estado observador permanente”, com acesso a fóruns mas sem direito a voto.

Com a França também a prometer reconhecimento em breve, e o Reino Unido a seguir o mesmo caminho, quatro dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU estarão ao lado da Palestina — à exceção dos Estados Unidos, principal aliado de Israel.

Os EUA reconhecem a Autoridade Palestiniana desde os anos 90, mas nunca reconheceram formalmente o Estado da Palestina. Diversos presidentes apoiaram essa ideia, mas Donald Trump não está entre eles. As suas administrações alinhavam inequivocamente com Telavive.

Publicidade_Página Home_Banner_(1700px X 400px)

Anuncie aqui: clique já!

Sem o apoio norte-americano, um processo de paz com resultados concretos parece inalcançável.

Por que o Reino Unido decidiu agir agora?

Governos britânicos anteriores manifestaram intenção de reconhecer a Palestina apenas no contexto de um processo de paz abrangente, com apoio de aliados ocidentais e no momento de “impacto máximo”.

Mas os acontecimentos recentes precipitaram uma mudança de rumo. As imagens de fome em Gaza, a pressão política crescente dentro do Parlamento britânico e uma viragem na opinião pública forçaram o governo a agir.

Durante um recente debate parlamentar, David Lammy foi confrontado com apelos constantes à ação. O Ministro da Saúde, Wes Streeting, resumiu o sentimento geral ao afirmar: “Reconheçamos a Palestina enquanto ainda há uma Palestina para reconhecer.”

Reconhecimento condicionado, mas inevitável

O Reino Unido não está apenas a seguir o exemplo da França ou dos governos da Irlanda, Espanha e Noruega. Starmer apresentou condições específicas: cessar-fogo imediato, suspensão da anexação da Cisjordânia (recentemente discutida no Knesset) e compromisso com uma solução pacífica de dois Estados.

Contudo, Downing Street sabe que Netanyahu dificilmente cederá. O líder israelita rejeitou repetidamente a criação de um Estado palestiniano.

Deste modo, o reconhecimento do Estado da Palestina pelo Reino Unido parece inevitável. Apesar da oposição feroz de Netanyahu, Starmer acredita estar a agir no momento de maior impacto possível.

No entanto, o Reino Unido de 2025 não é o de 1917. A sua capacidade de moldar o mundo é limitada. Resta saber que impacto terá realmente este gesto.