Ansiedade

A ansiedade faz parte das emoções normais e é conhecida, melhor ou pior, por todas as pessoas. Por isso, quando a ansiedade deixa de ser normal é facilmente desvalorizada e estigmatizada enquanto doença.

Estima-se que cerca de 20%-25% da população tenha algum tipo de perturbação de ansiedade. Destes, são poucos os que procuram ajuda médica atempadamente, o que atrasa o tratamento, que em geral é bastante eficaz, e pode agravar o prognóstico.

O que é a ansiedade e como se manifesta?

A ansiedade é uma emoção normal, que faz parte do conjunto de reações físicas e emocionais aos diversos estímulos externos. Portanto, dentro de determinados limites, é normal e até adaptativa.

Pode ser definida como um estado de medo ou receio motivado por fatores como a antecipação de uma situação potencialmente desagradável, a perceção de que se estará em perigo, a ser ameaçado ou vulnerável ao ambiente e às outras pessoas.

A ansiedade por manifestar-se por diversos sintomas, por exemplo:

  • Sintomas psíquicos: como medo, receio antecipado, inquietação, alteração da concentração / atenção;
  • Sintomas físicos: boca seca, dificuldade de deglutição (engolir), desconforto abdominal, náusea, flatulência, alterações do trânsito intestinal, taquicardia, palpitações, sensação de opressão torácica, alterações génito-urinárias, disfunção sexual, tensão muscular, cefaleia, diaforese (transpiração em excesso), insónia.

A ansiedade como mecanismo adaptativo

Nas situações de perceção de ameaça ou de antecipação de uma situação desagradável ou de perigo há uma estimulação do sistema nervoso simpático que prepara o organismo para responder adequadamente, ou seja, para enfrentar uma potencial fuga ou luta perante uma ameaça.

Entre outras manifestações, a estimulação do sistema nervoso simpático provoca:

  • Alterações físicas: como oaumento da frequência cardíaca, da frequência respiratória e da sudorese;
  • Alterações cognitivas: como o aumento da concentração e a atenção.

Desta forma, o organismo é levado a um estado de alarme em relação ao meio externo e interno.

Quando é conseguido o controlo da ameaça, o efeito do sistema nervoso simpático diminui e é estimulado o sistema nervoso parassimpático. Este desencadeia respostas contrárias, como a diminuição da frequência cardíaca e respiratória, redução da atenção e concentração e diminuição do estado de alerta, passando-se assim ao estado basal não ansioso.

Este mecanismo adaptativo é normal e útil, em muitas situações, por exemplo:

  • Situações de perigo físico real, por exemplo andar de bicicleta numa estrada muito movimentada. Neste caso, a ativação física e cognitiva leva a que o condutor esteja mais atento, com reflexos despertos e evite situações potencialmente perigosas;
  • Situações vivenciadas como potencialmente desagradáveis, por exemplo fazer um exame, em que a ansiedade controlada nos faz estar mais atentos e concentrados.

O que são perturbações de ansiedade

Caso a ansiedade vivenciada seja excessiva para a situação, ou mesmo surja sem qualquer desencadeante, acaba por provocar incapacidade de resposta e sintomatologia desagradável e disfuncional para o doente (ter uma “branca” num exame, por exemplo). Nestas situações, a ansiedade é mal-adaptativa e entra-se no campo das perturbações de ansiedade.

As perturbações de ansiedade são muitas vezes acompanhadas de outras doenças psiquiátricas, quer como causa ou como consequência. É muito prevalente a existência simultânea de sintomatologia depressiva e ansiosa no mesmo doente, tal como é frequente o abuso de álcool ou ansiolíticos, com o objetivo de reduzir os sintomas.

Quer o consumo de tóxicos quer a coexistência com outras doenças, agravam o prognóstico e dificultam o tratamento das perturbações de ansiedade.

De acordo com as classificações mais recentes, consideram-se como principais perturbações de ansiedade as seguintes:

  • Fobia específica;
  • Perturbação de pânico;
  • Agorafobia;
  • Perturbação de ansiedade generalizada.

Perturbação de ansiedade generalizada

Esta doença caracteriza-se pela presença mais ou menos constante de sintomas de ansiedade, sem que exista qualquer evento desencadeante, seja de agravamento ou de alívio.

Entre os sintomas perturbação de ansiedade generalizada, destacam-se:

  • Manifestações físicas características de hiperatividade do sistema nervoso;
  • Preocupação/receio mais intensos e mantidos relativamente à generalidade ou totalidade dos aspetos da vida quotidiana, sem que haja um motivo compreensível para essa maior preocupação;
  • Excessivo estado de alerta, com irritabilidade, dificuldade de concentração, reduzida tolerância a ruídos;
  • Tensão muscular, que muitas vezes se manifesta como dores musculares;
  • Alteração do padrão do sono, com insónia, pesadelos e sono não reparador.

O que causa a perturbação de ansiedade generalizada

Não é possível identificar para esta doença uma causa única. Aceita-se que seja causada por fatores indutores de stress que atuam sobre uma personalidade predisposta à ansiedade, predisposição esta que pode dever-se a aspetos genéticos e/ou ao efeito de factos ambientais/familiares atuais e passados. O peso relativo destes fatores não está completamente esclarecido.

Em termos neurobiológicos, a perturbação de ansiedade generalizada parece dever-se a uma disfunção do sistema que origina a ansiedade fisiológica, levando à manutenção do estado de ansiedade que se verifica nestes doentes. Estruturas cerebrais como a amígdala, o tálamo, o hipocampo e o córtex pré-frontal ventro-lateral, e neurotransmissores, como a noradrenalina, serotonina e ácido gama amino-butírico (GABA) estão envolvidos nesta doença, contribuindo para a excessiva ativação e manutenção da ansiedade ou para a incapacidade de “desligar” e reduzir os sintomas.

Como é feito o diagnóstico

O diagnóstico de perturbação de ansiedade generalizada baseia-se na observação clínica do doente, uma vez que não existe qualquer meio complementar de diagnóstico que permita confirmar ou excluir o diagnóstico. No entanto, para exclusão de causas físicas que possam estar na origem dos sintomas, é possível ter de recorrer a análises clínicas e outros exames de diagnóstico.

A perturbação de ansiedade generalizada é acompanhada frequentemente de outras doenças psiquiátricas, como a depressão, e de outras perturbações de ansiedade, como fobia social ou perturbação de pânico. A presença de comorbilidades agrava o prognóstico.

Tratamento da perturbação de ansiedade generalizada

O tratamento desta doença frequente e limitativa tem em geral uma eficácia elevada. Tal como na generalidade das perturbações da ansiedade, baseia-se em medicação (psicofarmacologia) e psicoterapia, sempre que possível combinadas para otimizar a resposta terapêutica:

  • Os antidepressivos dos grupos dos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (SSRI) e da serotonina e noradrenalina (SNRI) são os mais frequentemente utilizados, sobretudo pelo seu perfil favorável de efeitos secundários.
     
  • Os ansiolíticos são por vezes combinados com os antidepressivos para acelerar a resposta terapêutica, mas sempre na perspetiva de reduzir a sua utilização o mais precocemente possível pelo risco de dependência. No entanto, este risco é reduzido se estes medicamentos forem usados em doses e períodos adequados, sendo muito maior o seu benefício do que o seu risco.
     
  • Poderão ser alvo de medicação específica outros sintomas que estejam presentes, como a insónia, mas num horizonte temporal curto.
     
  • Relativamente à psicoterapia, a vertente cognitivo-comportamental é a mais estudada e com melhores resultados.

O abuso de álcool, o consumo de substâncias ilícitas e o uso inadequado de medicamentos, são frequentes na perturbação de ansiedade generalizada e agravam o seu prognóstico, dificultando a adesão ao tratamento e a sua eficácia.

O estigma em relação às doenças psiquiátricas em geral e a desvalorização da ansiedade em particular, levam a que, com alguma frequência, os doentes demorem muito tempo até procurarem ajuda médica específica. Esta situação agrava a sua qualidade de vida, agrava o prognóstico da perturbação de ansiedade generalizada e potencia o agravamento de eventuais doenças concomitantes, quer psiquiátricas quer físicas, podendo mesmo constituir um fator de risco relevante para a vida do doente.

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