MozLife

Internacional/África: General Mkhwanazi desafia o poder: Acusações de corrupção abalam o governo sul-africano

Num gesto sem precedentes, um alto responsável policial denuncia ligações entre o crime organizado e membros do governo de Cyril Ramaphosa, conquistando o apoio da população

Um dos mais respeitados oficiais da polícia da África do Sul abalou o governo e conquistou a admiração de muitos cidadãos com acusações explosivas sobre a infiltração de grupos do crime organizado nos altos escalões da administração do Presidente Cyril Ramaphosa.

O general Nhlanhla Mkhwanazi fez as declarações de forma teatral — vestido com uniforme militar e rodeado por agentes fortemente armados e encapuzados, convocou uma conferência de imprensa para acusar o ministro da Polícia, Senzo Mchunu, de ligações com gangues criminosos.

Acusou ainda o seu superior de ter desmantelado uma unidade de elite responsável por investigar assassinatos políticos, depois desta ter descoberto um cartel de droga com ramificações nos setores empresarial, penitenciário, judicial e na procuradoria.

“Estamos em modo de combate. Estou a enfrentar os criminosos diretamente”, declarou, em discurso transmitido em direto pela televisão nacional no início do mês.

Crime organizado em níveis alarmantes

O crime organizado há muito preocupa a população sul-africana. Segundo o especialista Johan Burger, “atingiu um nível extremamente grave”.

Um dos casos mais notórios foi o do ex-chefe da polícia, Jackie Selebi, condenado a 15 anos de prisão em 2010 por aceitar subornos de um barão da droga italiano, Glen Agliotti.

No entanto, a intervenção pública do general Mkhwanazi é sem precedentes: foi a primeira vez que um oficial acusou publicamente um membro do gabinete — e logo o ministro responsável pela polícia — de cumplicidade com o crime organizado.

Apoio popular e impacto político

A reação foi imediata. Mchunu rejeitou as acusações como “infundadas e absurdas”, afirmando estar pronto para se defender. Mas a opinião pública ficou ao lado do general Mkhwanazi — com a hashtag #HandsOffNhlanhlaMkhwanazi a tornar-se viral.

O especialista Calvin Rafadi, da Universidade de Joanesburgo, comentou: “Ele é visto como alguém que não tem medo de enfrentar os problemas de frente”.

Publicidade_Página Home_Banner_(1700px X 400px)

Anuncie aqui: clique já!

Uma carreira marcada pela integridade

O general Mkhwanazi já tinha conquistado respeito em 2011 ao suspender o então chefe dos serviços de inteligência criminal, Richard Mdluli, aliado próximo do ex-presidente Jacob Zuma. Mdluli acabaria condenado a cinco anos de prisão por sequestro, agressão e intimidação — confirmando os receios de Mkhwanazi.

Na época, esperava-se que, com apenas 38 anos, fosse fácil de manipular. Mas, segundo Burger, “os políticos subestimaram-no profundamente”.

Apesar de elogios públicos, Mkhwanazi acabou afastado menos de um ano depois e foi mantido longe dos holofotes durante anos.

Regresso ao comando e nova batalha

Em 2018, regressou em força ao ser nomeado chefe da polícia provincial pelo então ministro da Polícia, Bheki Cele. Uma das suas missões principais era investigar os assassinatos ligados à intensa rivalidade política na província.

O encerramento dessa unidade especial por ordem de Mchunu levou à conferência explosiva do general, que denunciou o abandono de 121 processos que ficaram a ganhar pó nos arquivos nacionais.

“Morrerei por este distintivo. Não vou recuar”, afirmou, reafirmando a sua reputação de oficial incorruptível.

Um sistema policial fragilizado

Um estudo do Human Sciences Research Council revela que a confiança pública na polícia sul-africana está nos 22%, o nível mais baixo de sempre.

Desde o ano 2000, a polícia teve mais de 10 comandantes diferentes, com alguns condenados ou acusados de corrupção. Para Gareth Newham, do Instituto de Estudos de Segurança, “a disfunção afeta todos os níveis da instituição”.

Entre controvérsia e heroísmo

Apesar do apoio popular, Mkhwanazi também enfrentou investigações por alegada interferência num caso envolvendo um alto funcionário prisional — mas foi ilibado no mês passado. O partido EFF considerou a acusação como uma tentativa de sabotar um agente dedicado.

Críticas também recaem sobre o uso excessivo da força por parte de sua equipa, acusada de mortes em confrontos com suspeitos. Ainda assim, “os sul-africanos querem acreditar num herói dentro da polícia”, defende Newham.

E agora?

Com a saída de Mchunu, o país terá um novo ministro interino da Polícia a partir do próximo mês: Firoz Cachalia, jurista e ex-ministro da Segurança Comunitária.

Cachalia afirmou que as denúncias de Mkhwanazi são “altamente invulgares”, mas, se confirmadas, “teremos de reconhecer que ele agiu de forma justificada”.

O futuro do general está agora em jogo: ou comprova as suas acusações, ou poderá perder tudo. Mas, por enquanto, reforçou a sua imagem de oficial corajoso que enfrentou o poder político — pela segunda vez.