Após quase dois anos de violência crescente e deslocamentos forçados, os dados mais recentes do IPC (Classificação Integrada da Segurança Alimentar) confirmam o pior cenário: os limiares de fome foram atingidos em grande parte da Faixa de Gaza. Entre Abril e meados de Julho, mais de 20.000 crianças foram hospitalizadas devido a desnutrição aguda, sendo que 3.000 encontram-se em estado crítico.
Desde o dia 17 de Julho, pelo menos 16 crianças com menos de cinco anos morreram por causas diretamente ligadas à fome.
Em Julho, mais de 25% das mulheres grávidas e lactantes avaliadas pelas equipas da Action Against Hunger estavam desnutridas — um aumento de 16% em relação a Junho. A situação é especialmente alarmante entre crianças entre os 6 e os 23 meses, que, juntamente com estas mulheres, não conseguem suprir as suas necessidades nutricionais.
“A fome não é apenas uma estatística. É um processo lento e doloroso que encolhe os órgãos, colapsa o sistema imunitário e compromete as capacidades cognitivas,” explica Natalia Anguera, diretora de operações da Action Against Hunger para o Médio Oriente.
Atualmente, cerca de 300.000 crianças menores de cinco anos e 150.000 mulheres grávidas e lactantes necessitam urgentemente de suplementos terapêuticos. Apesar do colapso, quase uma centena de profissionais da Action Against Hunger continuam a trabalhar diariamente no terreno, disponibilizando suplementos nutricionais, água potável segura, campanhas de higiene e cuidados médicos.
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Comprar um espaço para minha empresa.Ajuda humanitária insuficiente e acesso bloqueado
Natalia Anguera denuncia que o problema não está na logística, mas no bloqueio imposto à ajuda humanitária:
“Nenhum novo modelo de entrega de ajuda funcionará — seja cais, lançamento aéreo ou centro isolado — se o cerco não for completamente e permanentemente levantado. A ajuda que chega é insuficiente e muitas vezes inadequada, exigindo água e combustível para preparação, recursos praticamente inexistentes. Além disso, os pontos de distribuição atuais são distantes, perigosos e excludentes.”
Com os alimentos inacessíveis, as estratégias de sobrevivência das famílias deixaram de visar a gestão da escassez e passaram a ser um mecanismo de sobrevivência pura: jejum forçado, diluição de refeições, partilha racionada de pão, empréstimos, mendicidade e recolha de alimentos no lixo são práticas quotidianas.
Profissionais enfrentam fome e insegurança para continuar a responder
Apesar de estarem também em situação de fome severa, as equipas da Action Against Hunger aumentaram em 700% o número de crianças tratadas face ao período da trégua. Atualmente, quase 400 crianças com menos de cinco anos estão a receber cuidados contra a desnutrição.
“O que vi ao chegar a Gaza foram edifícios destruídos e zonas sem sinais de vida. Nas tendas de deslocados, as crianças recolhem alimentos em silêncio, evitam contacto visual e escondem-se, tentando preservar a pouca dignidade que lhes resta”, relatou um membro da equipa técnica de nutrição no terreno.
As fornecimentos terapêuticos essenciais, como alimentos específicos para bebés e micronutrientes para grávidas, são extremamente escassos. Por isso, é fundamental permitir a entrada imediata e irrestrita de alimentos.
“Um fio de ajuda não é suficiente para sustentar dois milhões de pessoas à beira da fome há quase dois anos”, sublinha Anguera. “Precisamos que todas as barreiras administrativas à entrada de bens sejam eliminadas, que todas as fronteiras estejam abertas e operacionais, e que haja acesso total a todas as zonas da Faixa de Gaza.”
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Anuncie aqui: clique já!Apelo urgente a um cessar-fogo imediato e permanente
A Action Against Hunger reitera o seu compromisso com uma resposta humanitária baseada em evidências, imparcial e rápida, que chegue às populações mais afetadas.
A organização apela com urgência a todas as partes envolvidas para que:
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Garanta-se um cessar-fogo imediato e permanente, com libertação de reféns;
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Haja acesso seguro, regular e sem restrições para ajuda humanitária em todos os pontos da Faixa de Gaza;
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Os pontos de passagem fronteiriços sejam reabertos na totalidade, com retoma do fluxo de bens comerciais;
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A resposta humanitária seja liderada pelas Nações Unidas e organizações independentes.