O DNA extraído do crânio revelou cerca de 3% de ancestralidade neandertal, indicando que esse é o homem moderno mais antigo já descoberto.
Pesquisadores recriaram a possível aparência do humano moderno mais antigo já sequenciado. O resultado, publicado em um estudo, é uma imagem realista de uma mulher com cabelos escuros e cacheados e olhos castanhos. Em 1950, os arqueólogos descobriram um crânio enterrado numa gruta na República Checa. Como estava dividido em dois, os investigadores concluíram que os restos mortais pertenciam a dois indivíduos diferentes.
No entanto, graças à sequenciação do genoma realizada décadas mais tarde, os cientistas concluíram que o crânio pertencia, de facto, a uma mulher que viveu há 45 mil anos.
Chamavam-lhe Zlatý kůň, ou « cavalo dourado » em checo. A análise do ADN revelou que o seu genoma continha cerca de 3% de ascendência neandertal e que a mulher fazia parte de uma população de humanos modernos que provavelmente tinham acasalado com neandertais.
Utilizar a tecnologia para recriar o seu rosto
O desafio, no entanto, era compreender melhor quem era e como era a sua aparência.
Para responder a estas questões, os investigadores utilizaram dados recolhidos de vários tomogramas computorizados do crânio que fazem parte de uma base de dados online.
Descobriram que faltavam alguns elementos, nomeadamente uma grande parte do lado esquerdo do rosto da mulher.
« Uma informação interessante sobre o crânio é o facto de ter sido roído por um animal após a sua morte. Esse animal pode ter sido um lobo ou uma hiena », explica Cícero Moraes, coautor do estudo e especialista em design gráfico brasileiro. Para substituir as partes que faltavam, a equipa usou dados estatísticos compilados em 2018 por investigadores que criaram uma reconstrução do crânio.
Também consultaram duas tomografias, de uma mulher moderna e de um homem, enquanto criavam o rosto digitalmente.
Surpresas e especulações
« O que mais nos impressionou foi a robustez da estrutura [do rosto], nomeadamente da mandíbula [maxilar inferior]. Quando encontraram o crânio, os primeiros especialistas que o analisaram pensaram que se tratava de um homem, e é fácil perceber porquê. Além disso, o crânio tinha características muito compatíveis com o sexo masculino nas populações actuais », disse Moraes.
Os investigadores também descobriram que o volume endocraniano da mulher, ou seja, a cavidade onde se encontra o cérebro, era maior do que o dos indivíduos modernos da base de dados.
No entanto, os cientistas atribuíram este facto a « uma maior afinidade estrutural entre Zlatý kůň e os Neandertais do que entre Zlatý kůň e os humanos modernos ».
Com base nos resultados obtidos, foi possível recriar a aparência da mulher.
« Depois de termos o rosto básico, gerámos imagens mais objectivas e científicas, sem coloração (em tons de cinzento), com os olhos fechados e sem cabelo. Depois, criámos uma versão especulativa com pele pigmentada, olhos abertos, cabelo e pêlos no corpo. O objetivo desta última é dar-lhe um rosto mais compreensível para a população em geral », disse o cientista brasileiro.
Mas, para isso, usámos informação especulativa, porque não há forma de saber, por exemplo, qual seria a cor da pele, do cabelo ou dos olhos da mulher.