O alerta de diversos governos ao redor do mundo para o avanço das milícias da China em águas internacionais está ancorado em uma prática recorrente de navios pesqueiros chineses que já ganha contornos globais.
Acusadas de pesca ilegal, as embarcações com bandeiras da China não só geram uma crise ambiental, como desafiam as fronteiras geopolíticas. Como esse avanço se desenrola é o mais interessante – e preocupante – às nações.
Uma reportagem veiculada no portal Washington Examiner aponta um padrão na atuação das chamadas “milícias marítimas” da China. Primeiro, os navios se afastam das águas nacionais. Já fora da jurisdição, “apagam” o rastreamento por satélite e invadem mares proibidos sem detecção – uma prática proibida pelas leis internacionais.
“Nenhum país pratica mais pesca ilegal, não declarada e não regulamentada que a China”, apontou o especialista em relações exteriores Gordon Chang. Segundo ele, a tendência chinesa em desconsiderar as regras e regulamentos marítimos gera o questionamento sobre as reais aspirações geopolíticas de Beijing.
A delimitação marítima começou em 1982, na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. À época, os membros da ONU concordaram em controlar os recursos marítimos dentro de uma ZEE (Zona Econômica Exclusiva) de até 200 milhas. Além desse raio, são águas internacionais.
Enquanto Beijing diz ter cerca de 2,6 mil navios pesqueiros no mundo, especialistas do britânico Overseas Development Institute estimam a frota chinesa em 17 mil. Os EUA, por sua vez, dizem manter menos de 300 embarcações em águas distantes.
O desenvolvimento do setor pesqueiro chinês não se dá ao acaso: Beijing subsidia a indústria com bilhões de dólares por ano. O aumento de até dez vezes no subsídio ao óleo diesel garante que as embarcações viajem mais rápido e para mais longe.
Avanço global
Não é só no Mar do Sul da China que Beijing avança em domínio territorial. Navios de pesca já alcançaram as águas de África e América do Sul. Um relatório recente da organização ambiental Oceana apontou que mais de 430 navios chineses operam fora dos radares nas águas da Argentina desde 2018.
No Equador, uma tripulação de 20 cidadãos chineses foi detida por quatro anos após ser flagrada com 300 toneladas de frutos do mar pescados ilegalmente nas Ilhas Galápagos.
Enquanto isso, Gana e Nigéria também identificaram navios com bandeira chinesa. A Indonésia já classificou a pesca chinesa como “crime organizado transnacional”. Mas a tendência é que a tentativa de deter e multar essas embarcações nesses lugares esbarre na corrupção e na má governança.
“A China continuará pescando até que a comunidade internacional imponha custos à sua pesca ilegal”, disse Chang. “Até agora, os países mostraram grande relutância em proteger suas águas. Então, sim, os chineses são criminosos, mas permitimos que sejam”.