Europa/Ucrânia: Bomba, míssil, sabotagem… Quais são as explicações possíveis para a queda do avião de Yevgeny Prigozhin?

Embora a comissão de investigação russa tenha declarado que está a estudar todos os cenários possíveis para determinar a causa do acidente em que morreu o líder da milícia Wagner, a 23 de agosto, a teoria de uma bomba a bordo do avião parece ser a preferida pelos investigadores russos e pelos serviços secretos americanos.

No domingo, 27 de agosto, a comissão de investigação russa confirmou a morte de Yevgeny Prigozhin, líder do grupo mercenário Wagner, após ter efectuado uma análise do ADN da tripulação do avião que se despenhou na região de Tver, na Rússia, na quarta-feira, 23 de agosto.

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A comissão encarregada de investigar as causas da queda do avião ainda não anunciou qual dos quatro cenários possíveis é o mais provável: um ataque de míssil, uma bomba interna, sabotagem ou erro do piloto. De acordo com um relato de uma “fonte policial” ao meio de comunicação social russo RBC na noite do acidente, “todas as versões do que poderia ter acontecido estão a ser consideradas, incluindo erro do piloto, problemas técnicos e influências externas”.

Com base na análise das imagens da queda do avião e dos destroços no solo, nos pareceres de peritos em aviação e nas confidências de responsáveis militares, os meios de comunicação social russos e internacionais veicularam teorias, muitas vezes contraditórias, sobre as causas da morte de Yevgeny Prigozhin. Atualmente, tendem a defender a hipótese de uma bomba colocada a bordo do jato ou de uma sabotagem do avião.

Movimentos suspeitos registados pelo Flightradar24

No dia seguinte ao acidente, o site especializado em localização de aviões Flightradar24 publicou uma nota que descreve a atividade do voo de Yevgeny Prigozhin e dos seus homens. Com base nos dados comunicados pelo jato privado, o site refere que o avião, que partiu pouco antes das 18 horas, hora de Moscovo, atingiu uma altitude estável de cerca de 8.500 metros às 18.10 horas, que manteve a uma velocidade constante até às 18.19 horas. No minuto seguinte, o último registado pelo Flightradar24, os dados revelam movimentos suspeitos e uma queda de mais de 3.000 metros em 32 segundos. Na altura das últimas gravações, o avião estava apenas a 6000 metros acima do nível do mar.

Num podcast gravado no dia do acidente, o diretor de comunicação do Flightradar24, Ian Petchenik, sublinha que “muitos dos vídeos mostram pelo menos danos graves e até a falta de uma asa num dos lados do avião. Esta informação sobre a altitude e a velocidade vertical, combinada com as provas visuais, mostra que algo de muito grave aconteceu a este avião”. A probabilidade estatística de se tratar de um acidente, de uma falha mecânica ou de algo do género, sem influência externa, […] tendo em conta os recentes acontecimentos geopolíticos, é quase nula”, considera.

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Uma opinião partilhada pelo seu co-apresentador, o entusiasta da aviação Jason Rabinowitz, uma vez que “não creio que ninguém tenha a ilusão de que se tratou de um simples acidente. Isso seria excecionalmente improvável neste caso”. No entanto, os dois especialistas mantêm-se cautelosos quanto à causa do acidente, citando apenas as primeiras informações da imprensa anglo-saxónica sobre um ataque de míssil ou uma bomba a bordo.

A hipótese dos mísseis antiaéreos

No canal de Telegram Grey Zone, reputado como próximo do grupo Wagner, a queda do avião de Yevgeny Prigozhin foi anunciada, inicialmente de forma condicional, mas em várias ocasiões, como tendo sido “derrubado por fogo da defesa aérea no distrito de Bologovsky, na região de Tver”. Depois de analisarem as imagens da queda do avião, estes apoiantes de Wagner afirmam que as marcas brancas vistas no céu perto do avião são “características da defesa aérea” e, por isso, acreditam “com um grau significativo de probabilidade [que] a versão de um ataque terrorista também é remota, dado que não houve destruição da estrutura do avião no ar”. Com base nas mesmas imagens, o jornal israelita Times of Israel escreveu também que estas “mostram o que parece ser o rasto de um míssil antiaéreo”.

A hipótese de um míssil antiaéreo foi também veiculada pela imprensa ocidental, na sequência de um despacho da agência britânica Reuters, de 24 de agosto, que começou por referir que “os Estados Unidos acreditam que um míssil terra-ar proveniente do interior da Rússia terá provavelmente abatido o avião que supostamente transportava o líder mercenário [Yevgeny Prigozhin] na quarta-feira”. O órgão de comunicação social baseou-se em declarações feitas por “dois funcionários norte-americanos na quinta-feira [24 de agosto]”. No entanto, a agência noticiosa diz que as suas fontes “sublinharam que a informação era ainda preliminar e estava a ser revista”.

Esta precaução necessária foi depois modificada no despacho, uma vez que, na quinta-feira, o porta-voz do Pentágono, Patrick Ryder, desmentiu esta teoria numa conferência de imprensa. Falando aos jornalistas, disse que “a imprensa noticiou um tipo de míssil terra-ar que abateu o avião. Acreditamos que esta informação é incorrecta. [Não existe qualquer informação que sugira a existência de um míssil terra-ar”. Este desmentido foi registado pelo motor de busca russo Yandex (o equivalente russo do Google) na sua página de notícias.

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Com base nas afirmações da Grey Zone, mas também nas declarações feitas por dois funcionários americanos à Reuters, a imprensa russa também transmitiu a teoria de um míssil terra-ar. Num artigo em que passa em revista os diferentes argumentos citados na imprensa a favor e contra as teorias que explicam a queda do avião, o órgão de comunicação social independente russo Meduza salienta que, num dos vídeos, o fumo visível no céu “parece um rasto de um míssil antiaéreo”. Cita também testemunhos de pessoas no terreno que dizem ter ouvido dois estrondos, o que corresponderia a dois disparos de mísseis, o que “é uma prática comum que aumenta a probabilidade de atingir o alvo”. Por fim, Meduza, mais cauteloso, refere que, em algumas fotografias de má qualidade, se podem ver vestígios nos destroços do avião que são semelhantes aos danos causados por uma ogiva de míssil antiaéreo.

Uma operação demasiado complicada

A utilização de um míssil terra-ar para abater um avião na região russa de Tver indicaria o envolvimento das forças armadas russas na morte de Yevgeny Prigozhin. Na sexta-feira, 25 de agosto, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, qualificou de “mentiras absolutas” as insinuações feitas pelos dirigentes ocidentais que acusam Vladimir Putin de ter eliminado o homem que ousou desafiá-lo durante um putsch abortado em 24 de junho de 2023.

Para além do desmentido oficial do Pentágono, a ideia de que um míssil disparado da Rússia abateu o avião de Prigozhin foi posta em causa por vários argumentos. Meduza reconhece que não é fácil abater um avião a mais de 8000 metros de altitude. Os meios de comunicação social desqualificam os sistemas de mísseis aéreos portáteis ou de curto alcance como incapazes de atingir um tal alvo. Seria então necessário utilizar “no mínimo, um complexo de médio alcance que deve ser utilizado perto da rota aérea utilizada pelo avião”, observa o Meduza, que sublinha que este tipo de arma “causaria danos muito mais graves ao avião do que os mostrados pelos vídeos das testemunhas oculares: em caso de impacto de uma ogiva de 70 kg e 7000 submunições, um avião desta dimensão dificilmente cairia inteiro”.

Entrevistado pela Crimea Liberties, uma subsidiária da Radio Free Europe/Radio Liberty (financiada pelo Congresso dos EUA e proibida na Rússia), o especialista militar Yuri Fedorov concorda que tal tiro só poderia ter sido disparado por um grande sistema antiaéreo, como um S-300 ou S-400. No entanto, considera que uma tal operação teria envolvido demasiadas pessoas a diferentes níveis da hierarquia, o que teria posto em risco a sua execução.

A bomba a bordo, a pista preferida dos Estados Unidos

A outra hipótese mencionada pela imprensa russa e por funcionários americanos (ainda sob condição de anonimato) aos meios de comunicação ocidentais, como o canal americano ABC, é a de que uma bomba tenha sido colocada a bordo do avião. Se a explosão não veio do exterior, então a armadilha deve ter vindo do interior.

Numa conferência de imprensa realizada na terça-feira, 29 de agosto, a embaixadora dos Estados Unidos para a justiça penal mundial, Beth Van Schaack, declarou a um jornalista que “tudo parece indicar que havia uma espécie de explosivo a bordo do avião que provocou a sua queda”. Seis dias após o incidente, esta declaração de uma funcionária, nomeada para o cargo por Joe Biden, reforça os testemunhos de funcionários americanos que, até então, tinham dito ao New York Times ou ao Wall Street Journal, sob condição de anonimato, que os satélites americanos não tinham detectado qualquer disparo de míssil antes da queda do avião, ou que a explosão era considerada a principal teoria prevista pelos serviços americanos.

O Wall Street Journal realizou uma análise vídeo aprofundada, publicada a 25 de agosto, na qual se baseou nos pareceres de três peritos em aviação e nos testemunhos das suas fontes dos serviços secretos americanos. Embora cautelosos, uma vez que não puderam aceder ao local do acidente, estes peritos consideram, contrariamente à opinião dos peritos do Meduza, que “a nuvem de fumo perto do avião parece ser o que resta de uma explosão interna”, uma vez que “um ataque de míssil criaria longos rastos de fumo”. Além disso, insistem que o avião só perdeu uma asa nas imagens, enquanto “um ataque de míssil capaz de atingir mais de 20.000 pés teria despedaçado o avião” e espalhado os vários pedaços de destroços numa área mais vasta do que a observada pelo satélite.

A análise das imagens da queda do avião leva-os a crer que “a substância branca que segue o avião é mais um indício de uma explosão interna”, uma vez que não corresponde a fumo “mas sim a combustível do avião que se derramou no ar devido à rutura dos tubos de combustível. Um míssil teria provavelmente inflamado o combustível derramado, produzindo fumo negro”. A explosão pode ter ocorrido “perto da cauda do avião”. Quanto às marcas nos destroços do avião, os peritos entrevistados pelo Wall Street Journal consideram que estas marcas são “marcas normais de impacto e provavelmente não são estilhaços de mísseis”, que “são causadas por secções aparafusadas que se rasgam e por pedaços do avião que batem noutras partes do avião”.

Reparações alguns dias antes do último voo

Do lado russo, o meio de comunicação Shot menciona a possibilidade de uma explosão a bordo do avião, indicando que se trata de uma versão que está a ser estudada pela investigação oficial russa, segundo a qual “o engenho explosivo foi colocado na zona do trem de aterragem”. O meio de comunicação social russo Baza refere ainda que, segundo as suas fontes, “a versão relativa à utilização da defesa aérea não é prioritária. De acordo com os peritos, as partes [do avião] que caíram no chão não estão suficientemente danificadas” e que eles defendem a hipótese de que “a explosão ocorreu no compartimento de serviço”, situado perto das casas de banho.

O jornal Moskovskij Komsomolets (MK) e o sítio de Internet Lenta revelaram que o avião tinha sido reparado alguns dias antes do voo fatal do chefe do grupo Wagner e que pessoas tinham tido acesso ao interior do aparelho.

Entre as pistas investigadas pelo Moskovskij Komsomolets, que poderiam ter conduzido à colocação de uma bomba no avião, o jornal referiu que o sistema de ar condicionado do avião tinha sido reparado. De 18 de julho a 23 de agosto, o jato privado não voou. De acordo com o MK, a companhia aérea demorou muito tempo a obter um permutador de ar, uma peça que é instalada no sistema de ar condicionado. A peça foi instalada a partir de 19 de agosto, quatro dias antes do voo de Prigojine. O jornal especula que uma bomba poderá ter sido instalada durante os trabalhos de reparação. “Os investigadores terão de examinar as câmaras de segurança do aeroporto [Sheremetyevo] a partir de 19 de julho”, adianta o jornal, que acredita que, a partir dessa data, o avião poderá ter sido armadilhado por técnicos ou funcionários do aeroporto.

Dois visitantes estrangeiros no dia do acidente

Os meios de comunicação russos revelaram também que duas pessoas foram registadas como tendo visitado o avião em 23 de agosto, o dia do acidente. Trata-se de Alexandra Yulina e Sergei Klokotov, que são, respetivamente, Presidente do Conselho de Administração da RusJet Airline e Diretor Técnico da mesma companhia aérea. De acordo com as informações da MK, visitaram o avião de manhã, entre as 9h30 e as 10h30, na companhia de Natalia Minibayeva, responsável pelo avião, e do copiloto Rustam Karimov, que morreu no avião com Prigozhin algumas horas mais tarde.

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Segundo Natalia Minibayeva, o motivo da visita destes dois funcionários de uma companhia aérea rival foi a venda do jato. MK escreve que lhes garantiu “que o homem e a mulher estavam sempre à vista, ou seja, não tiveram sequer a oportunidade de deixar um objeto estranho a bordo do avião”. Em declarações ao canal Telegram russo VChK-OGPU, Alexandra Yulina, que inspeccionou o avião para a RusJet Airline, afirmou que “o avião estava como saiu da fábrica, sem quaisquer modificações. Um avião normal, nada de extraordinário”.

Em 24 de agosto, um dia depois do acidente, os meios de comunicação social do Telegram Baza e do VChK-OGPU transmitiram a informação de que os inspectores estavam à procura do primeiro suspeito. O suspeito é Artem Stepanov, piloto e fundador da companhia aérea MNT, que transportava Prigozhin. Suspeita-se que tenha tido acesso ao avião no dia anterior ao voo do chefe da Wagner. Interrogado pelos meios de comunicação social, o irmão declarou que se encontrava de férias na região de Kamchatka, no outro extremo da Rússia, no nordeste, com vista para a costa do Pacífico, e que “já foi contactado por quem precisa de o contactar”.

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