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Internacional/Ásia: Índia Resiste a Pressões dos EUA: Mercado Agrícola Fechado e Compra de Petróleo Russo Mantida

Enquanto os Estados Unidos aumentam tarifas e ameaçam penalidades, Nova Délhi mantém firme sua posição estratégica e prioriza interesses nacionais diante da crescente rivalidade geopolítica com a China.

Nova Délhi não pretende abrir seu mercado agrícola aos americanos, deseja continuar comprando petróleo russo e se posiciona com firmeza na região para conter a dominação chinesa. Nesse cenário, a primeira-ministra Narendra Modi não demonstra pressa para assinar acordos com Donald Trump.

O presidente americano Donald Trump anunciou em sua plataforma Truth Social que os produtos indianos estarão sujeitos a tarifas de 25% ao chegarem aos Estados Unidos a partir de 1º de agosto, além de uma “penalidade” adicional para a compra de petróleo russo.

“Fazemos pouco comércio com eles porque suas tarifas são umas das mais altas do mundo e as barreiras não tarifárias são as mais cansativas e odiosas”, justificou Donald Trump em sua mensagem.

“Temos um déficit comercial massivo com a Índia!”, destacou o mandatário norte-americano.

Porém, a Índia também “comprou a maior parte de seu equipamento militar da Rússia e é um dos principais clientes de petróleo russo, junto com a China, enquanto todos desejam que a Rússia pare de matar na Ucrânia”.

Essa situação justifica, para o presidente americano, “uma penalidade”, que será aplicada além dos 25%, sem especificação clara, e que também entrará em vigor a partir de 1º de agosto.

Nova Délhi não cede

Essa nova tarifa sobre produtos indianos representa uma redução simbólica de 1 ponto percentual em relação aos 26% anunciados inicialmente no começo de abril, quando os direitos de importação foram apresentados de forma incorreta como “recíprocos” por Donald Trump.

Na terça-feira, o presidente americano já indicava que as tarifas para produtos “made in India” poderiam variar entre 20% e 25%, acrescentando que ainda havia possibilidade de acordo.

Nova Délhi e Washington têm negociado há meses um acordo comercial, sem resultados concretos até o momento, já que a Índia não deseja abrir totalmente seu mercado para produtos agrícolas americanos.

“A Índia e os Estados Unidos estão em negociações há alguns meses para concluir um acordo bilateral justo, equilibrado e mutuamente benéfico. Continuamos comprometidos em alcançar esse objetivo”, declarou o governo indiano em comunicado oficial.

Mas até agora, a Índia não cede. Diferentemente do Reino Unido, Japão ou União Europeia, que parecem se submeter à vontade do presidente americano, Narendra Modi permanece inflexível. As exportações indianas para os EUA representam apenas uma pequena parte da economia local, mesmo atingindo 87,4 bilhões de dólares, segundo o governo americano. E Nova Délhi não quer flexibilizar suas barreiras, especialmente na abertura do setor agrícola para empresas americanas. O interesse nacional é prioridade.

“A Índia poderia ceder um pouco, mas as chances disso acontecer não são grandes, pois as linhas vermelhas da Índia são claras no setor agrícola, especialmente em relação a alimentos geneticamente modificados e produtos lácteos, não há possibilidade de retroceder”, avaliou Jayant Dasgupta, ex-embaixador da Índia na Organização Mundial do Comércio, em entrevista à CNBC.

Principal cliente do petróleo russo

Outro ponto que irrita Washington é a compra de petróleo da Rússia, na qual a Índia não pretende recuar.

“O que precisamos esclarecer é a respeito dessa penalidade. É uma ameaça? Se a Índia continuar importando petróleo russo, sofrerá sanções? Isso vale para certos produtos ou para todos?”, questionou Ajay Sahai, diretor-geral da Federação Indiana das Organizações Exportadoras.

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A Índia é considerada um dos maiores compradores de petróleo russo, apesar das sanções. Para Nova Délhi, isso representa uma oportunidade, com preços mais baixos enquanto Moscou busca financiar seu esforço de guerra na Ucrânia.

Recentemente, Donald Trump endureceu o tom, frustrado pela falta de avanços em um possível acordo de paz entre Rússia e Ucrânia, e acusando abertamente o presidente russo Vladimir Putin de não buscar o fim do conflito.

Trump agora ameaça países que compram petróleo russo e iraniano com sanções “secundárias”, consistindo em tarifas adicionais sobre produtos desses países.

China e Índia estão entre os principais compradores de petróleo russo.

Na sequência, Trump anunciou um acordo com o Paquistão para “desenvolver suas enormes reservas de petróleo”, sem dar detalhes, acrescentando que “talvez um dia eles vendam petróleo para a Índia!”.

Estratégica para conter a China

Por fim, a Índia sabe que ocupa posição estratégica para conter a influência chinesa na região.

“Do ponto de vista estratégico, os EUA têm pouco interesse em antagonizar a Índia. Eles a veem como um parceiro sólido, capaz de moldar o panorama indo-pacífico”, avalia Harsh V. Pant, vice-presidente de estudos e política externa da Observer Research Foundation.

Os Estados Unidos fazem da China seu principal adversário global, e a Casa Branca compreendeu que a ascensão da Índia contraria Pequim. Com cada vez mais empresas transferindo sua produção da China para a Índia — como a Apple, que hoje fabrica mais iPhones na Índia para o mercado americano do que na China —, os EUA acreditam que controlarão melhor as cadeias de valor na Índia do que na China, visando repatriar suas fábricas.

Para lembrar, as tarifas anunciadas em abril foram adiadas duas vezes: inicialmente por 90 dias até julho, e depois até 1º de agosto, para dar tempo às negociações comerciais.

Até agora, apenas seis acordos foram anunciados, com parceiros comerciais importantes dos EUA como União Europeia, Reino Unido e Japão, que terão seus produtos taxados em 15%.

Washington também anunciou acordos com Filipinas, Vietnã e Indonésia.