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Internacional/Médio-Oriente – EUA e Irão em negociações diretas para um novo acordo nuclear: entre prudência, avanços discretos e desafios persistentes

Estão em curso negociações diretas entre representantes da administração Trump e do Irão, com o objetivo de alcançar um acordo que limite o programa nuclear iraniano e garanta que Teerão nunca possa desenvolver uma arma atómica. Em troca, os iranianos esperam a levantação das sanções económicas que há anos afetam o país. Contudo, depois de vários impasses e do colapso do acordo de Viena de 2015 — abandonado por Trump durante o seu primeiro mandato — a cautela continua a dominar as conversações.

“Quero que o Irão seja um país maravilhoso, grande e feliz, mas não podem ter armas nucleares”, afirmou Donald Trump em abril passado, adotando um tom surpreendentemente conciliador em relação à República Islâmica, que no passado descreveu como “o maior patrocinador estatal do terrorismo”.

Este novo tom surge num contexto internacional inesperado: americanos e iranianos estão a negociar diretamente, por iniciativa da Casa Branca. O objetivo declarado é claro: criar um novo quadro de entendimento sobre o programa nuclear iraniano, em troca do levantamento das sanções. As conversações, embora discretas, alimentam a possibilidade concreta de um acordo entre dois Estados que mantêm relações hostis desde 1979.

Ainda assim, permanece o risco de impasse ou mesmo de uma escalada aberta no Médio Oriente.

Negociações discretas, mas com sinais de progresso

Desde o início de 2025, os encontros bilaterais entre os EUA e o Irão têm decorrido com alguma visibilidade, mas o conteúdo dos diálogos continua envolto em segredo. As primeiras sessões realizaram-se em abril, em Mascate, sob a mediação do ministro dos Negócios Estrangeiros de Omã, Badr bin Hamad al-Busaidi. Seguiram-se outras rondas em Roma e novamente em Omã, com um quarto encontro previsto para 3 de maio que acabou por ser adiado.

Apesar da ausência de comunicados oficiais ou imagens, surgiram declarações encorajadoras. O vice-presidente norte-americano, J. D. Vance, referiu a 7 de maio que as conversações estavam “no bom caminho”. A mediação de Omã foi essencial para reativar canais diplomáticos, tal como no processo secreto que precedeu o acordo de Viena de 2015.

Washington exige a suspensão imediata do enriquecimento de urânio, considerando os níveis atuais excessivos. Teerão, por outro lado, insiste no seu direito ao uso de energia nuclear para fins civis. Apesar das divergências, as partes parecem adotar agora uma linguagem comum de compromisso pragmático. O chefe da diplomacia iraniana, Abbas Araghchi, classificou os encontros como “construtivos”, enquanto o líder supremo, Ali Khamenei, considera algumas exigências americanas “excessivas e escandalosas”.

Apesar das dificuldades, o diálogo prossegue a um ritmo inédito desde a saída dos EUA do acordo de 2018, o que revela uma mudança estratégica significativa. A escolha de Omã, ator neutro e paciente, simboliza a vontade mútua de evitar a rutura.

Um novo acordo nuclear parece mais próximo

As negociações já permitiram avanços substanciais que apontam para um possível acordo bilateral fora do âmbito do Conselho de Segurança da ONU ou do P5+1. Donald Trump anunciou a 15 de maio que o Irão teria “de certa forma” aceitado os termos de um eventual entendimento.

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As conversas políticas deram lugar a negociações técnicas sobre o programa nuclear, com encontros semanais entre delegações em Roma e Mascate. Apesar da ausência de detalhes oficiais, tudo indica que o eventual acordo será diferente do JCPOA de 2015, dada a evolução do contexto internacional.

Desde a denúncia do acordo de Viena pelos EUA em 2018, o Irão tem enriquecido urânio a cerca de 60%, segundo a AIEA — um nível próximo dos 90% necessários para uso militar. No entanto, Teerão nunca declarou a intenção de fabricar uma arma nuclear, sustentando-se numa fatwa do ayatollah Khamenei que condena tal arma como contrária ao Islão.

Por sua vez, os Estados Unidos limitam o novo entendimento exclusivamente ao nuclear, deixando de fora temas como o programa balístico iraniano ou a sua política regional. Trump afirmou recentemente: “Não preciso de 30 páginas de detalhes. Basta uma frase: eles não podem ter uma arma nuclear.”

Desafios persistentes dificultam a conclusão

Apesar do clima mais construtivo, permanecem obstáculos internos e externos significativos. No Irão, o líder supremo mantém um discurso cético e denuncia exigências “sem sentido”. Já o ministro dos Negócios Estrangeiros sublinha que o direito ao enriquecimento nuclear é inegociável.

Nos EUA, ainda que Trump possa assinar um acordo executivo sem aprovação do Congresso, o legislativo continua a ser um fator essencial. A 8 de maio, uma resolução não vinculativa expressou a oposição de grande parte do Congresso, dominado por republicanos, tradicionalmente contrários a qualquer aproximação ao Irão. Grupos de pressão pró-Israel, como a AIPAC e o CUFI, intensificam a sua oposição a qualquer entendimento.

No Médio Oriente, Israel mantém a sua posição habitual, alertando que o Irão está prestes a obter a arma nuclear. O governo de Telavive já ameaçou por diversas vezes realizar ataques unilaterais às instalações iranianas, o que poderia desencadear uma nova crise regional. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, em visita a Washington no início de abril, reafirmou a sua linha dura.

As monarquias árabes do Golfo, por sua vez, adotam hoje uma posição mais equilibrada do que há uma década. Procuram garantir o apoio político e militar dos EUA e mantêm, em paralelo, canais diplomáticos ativos com o Irão.

Europa relegada para segundo plano

A União Europeia, que desempenhou um papel central nas negociações do JCPOA, está hoje completamente marginalizada. O fracasso do mecanismo INSTEX e o alinhamento europeu com as sanções dos EUA em 2018 destruíram a confiança de Teerão nas intenções europeias.

As negociações de Viena, relançadas em 2021, não produziram resultados e parecem agora totalmente irrelevantes face ao canal direto entre Washington e Teerão. Diplomatas europeus admitem não estar informados nem consultados nas negociações em curso, ficando à margem de um dossiê que já lideraram no passado.