Eleições em Moçambique: Advogados criticam decisão do Conselho Constitucional

A Ordem dos Advogados de Moçambique considera que a proclamação dos resultados das eleições autárquicas pelo Conselho Constitucional careceu de fundamentação e pede a revisão da legislação eleitoral.

A Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) considera que a proclamação dos resultados das eleições autárquicas pelo Conselho Constitucional careceu de fundamentação e pede a revisão da legislação eleitoral.

Numa nota de 01 de dezembro consultada pela Lusa, a OAM afirma que o Conselho Constitucional (CC) “deve exercer os seus poderes de cognição conhecendo a matéria de facto e de direito”, e com isso “fundamentando as suas decisões, não podendo e nem devendo limitar-se a dizer ‘os resultados decorreram da reverificação dos dados, de acordo com a prova produzida'”.

O CC proclamou em 24 de novembro a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) vencedora das eleições autárquicas de 11 de outubro em 56 municípios, contra os anteriores 64 anunciados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), com a Renamo (Resistência Nacional Moçambicana, maior partido da oposição) a vencer quatro, e mandou repetir eleições em outros quatro. Antes, alguns tribunais distritais chegaram a anular várias votações, mas o CC assumiu que não tinham essa responsabilidade.

“A exigência de fundamentação, ausente em absoluto no acórdão do CC, é a expressão da legitimidade do exercício jurisdicional e deve ser a necessária a explicitar as razões da decisão, para o entendimento e o alcance dos intervenientes processuais, mas, sobretudo, para a sociedade, dado o interesse público que reveste o processo eleitoral”, lê-se.

“Não se está a dizer que as decisões devem agradar à maioria ou à minoria, mas que devem ser fundamentadas como exigência legal. Aliás, a vida é plural e ninguém tem o monopólio da verdade, mas temos de nos permitir e aceitar o contraditório, pois de contrário caímos no autoritarismo. A intensidade do pulso não pode sobrepor-se à força da mente e das mãos”, acrescenta a nota da OAM, assinada pelo bastonário, Carlos Martins.

As ruas de algumas cidades moçambicanas, incluindo Maputo, têm sido tomadas por consecutivas manifestações da oposição contra o que consideram ter sido uma “megafraude” no processo das eleições autárquicas e os resultados anunciados pela CNE, fortemente criticados também pela sociedade civil e organizações não-governamentais.

A OAM insiste que a forma como estas eleições foram conduzidas levaram ao “descrédito total dos moçambicanos relativamente aos Órgãos de Administração Eleitoral, com destaque para a CNE e para o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE)”.

“Sucedendo o mesmo para com os Tribunais Judiciais Distritais enquanto tribunais eleitorais de primeira instância no decurso dos processos eleitorais, Conselho Constitucional, e, por arrastamento, quanto aos poderes Executivo e Legislativo, bem como aos partidos políticos e suas respetivas lideranças, por falta de confiança sobre a sua idoneidade e legitimidade, equilíbrio e independência na missão para que foram instituídas”, lê-se.

Para a OAM, o “princípio da neutralidade das instituições que regem o processo eleitoral deve ser seguido” e “não parece avisado” seguir “para outros pleitos eleitorais com estas leis” — Moçambique realiza eleições gerais em outubro de 2024 — “e instituições de administração eleitoral, e nem sua respetiva composição”.

Acrescenta que “é do conhecimento geral” que a Lei Eleitoral moçambicana “é uma péssima cópia da legislação eleitoral portuguesa, mas, em abono da verdade, seja dito, em matéria de recurso eleitoral ela regulou diversamente do seu farol, que é a Lei Eleitoral portuguesa”.

“Neste ordenamento jurídico ficou assente que os tribunais judiciais, como tribunais de primeira instância, tem competência para o tratamento de contencioso de apresentação de candidaturas, diversamente do sufragado na nossa legislação eleitoral referente às eleições autárquicas”, lê-se.

“Exigem-se leis eleitorais previsíveis e que acompanhem a evolução dos processos democráticos, do pensamento e da forma de estar em sociedade. As instituições eleitorais, incluindo as instâncias judicias, devem preservar a independência, como fator de legitimação da sua própria existência e poder. De contrário, o caminho será tortuoso”, conclui.

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