Brasil: Em São Paulo, o graffiti gigante conquistou os corações do povo

As obras multiplicaram-se durante a pandemia, tornando a maior metrópole brasileira numa cidade que pode agora ser visitada de olhos bem abertos.

Kleber Pagu sai do elevador e sobe as últimas escadas até ao telhado do edifício. Já equipado com o seu arnês, Mauro Neri revê o esboço da sua obra: “Inspirei-me no desenho de uma criança negra do artista Kadir Nelson. Adicionei uma lata de tinta nas suas mãos e a palavra “Justiça” no seu rosto.

Kleber Pagu vai ver os proprietários do edifício como o produtor do graffiti. Ele quer ter a certeza de que tudo está bem: “Eles estão felizes, mas nem sempre é esse o caso”. Mauro Neri sobe o corrimão “sem nunca olhar para baixo”, e a roldana leva-o para baixo lentamente. A obra Justiça, adorna agora uma parede de um edifício de oito andares na Rua Augusta, a 50 metros das colagens de Luis Bueno em duas paredes de 490 metros quadrados de um edifício de 13 andares.

Estas obras gigantescas multiplicaram-se durante a pandemia de Covid-19 e fazem de São Paulo uma cidade que pode agora ser visitada de olhos bem abertos. Aos domingos, o viaduto de Minhocao torna-se pedestre e é apreciado tanto pelo espaço que ganhou em relação aos carros como em relação aos graffiti. “Não fui muito sensível a esta arte, mas tenho de admitir hoje que ela embeleza realmente a cidade”, considera Roberto da Vila. Este reformado admira o trabalho de Robinho Santana Algo sobre nós, que mistura grafite e pichaçao, uma etiqueta muito gráfica feita de letras e símbolos, que ainda é considerada um crime.

Embora o pichaçao ainda receba uma má imprensa, o graffiti conquistou os corações dos paulistas. Um novo projecto de lei apresentado pela esquerda propõe transformar a cidade numa “galeria de arte ao ar livre”, tornando 30 lugares já emblemáticos do graffiti seguros e promovendo a arte urbana.

“A ideia é facilitar a produção destas obras e oferecer-lhes protecção. A arte deve ser acessível àqueles que nunca vão a museus. Mas não queremos que a cultura se limite às paredes: estes 30 lugares tornar-se-iam espaços livres para arte e performance”, explica Kleber Pagu, que concebeu a conta com a sua mulher, a bailarina Fernanda Bueno. O conselheiro municipal Toninho Vespoli, o autor da lei, diz estar agora “certo de que será adoptada pela Câmara Municipal. Existe hoje um consenso sobre os benefícios do graffiti para São Paulo”.

O deputado pela cultura é igualmente positivo: “Claro que somos a favor, o graffiti é a própria identidade de São Paulo, e nós apoiamo-lo. Aline Torres cita as realizações financiadas pela Câmara Municipal: em primeiro lugar, o Museu de Arte de Rua, criado em 2017 e que tem 237 obras, incluindo as de Mauro Neri, Luis Bueno e Robinho Santana. A plataforma do museu permite-lhe vê-los em 360 graus sem sair de casa. E este ano, o departamento cultural planeia “grafitar” cerca de 30 túneis.

No entanto, a ala direita que dirige a cidade nem sempre apreciou esta arte. Em 2017, o presidente da câmara municipal João Doria, agora governador de São Paulo, pegou num rolo para pintar graffiti cinzento que tinha sido autorizado pela anterior administração de esquerda. Em frente às câmaras, prometeu uma “guerra ao pichaçao e um controlo do graffiti”. O vereador Eduardo Suplicy, que foi também o autor do projecto de lei, recorda que “os artistas foram rapidamente apoiados pela população e Doria teve de admitir o seu erro. Mas infelizmente esta tinta cinzenta ainda está a ser utilizada. Mauro Neri foi preso várias vezes pela polícia, as suas obras cobertas de cinzento: “Até já tive obras financiadas pelo serviço cultural e cobertas pelo serviço de limpeza”.

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Fernanda Bueno mostra as diferentes camadas de tinta cinzenta à volta da Praça Roosevelt, um importante local de graffiti, entre os desenhos pintados por spray que os artistas fazem repetidamente: “É absurdo, porque quereria uma cidade cinzenta? Em 2019, a Câmara Municipal cobriu metade de um magnífico mural antes de serem parados. Depois financiou a sua reparação, contratando os mesmos artistas”.

Os dois produtores estão a passar pelo inferno com o seu projecto de “aquário urbano”, em 15 edifícios no centro da cidade, que vai ser o maior graffiti do mundo. Um edifício está a quebrar a continuidade do trabalho de 7.000 metros quadrados do artista Felipe Yung ao recusar-se a dar o seu lado. “Sou acusado de um crime ecológico por ter ignorado esta permissão! Esta lei do graffiti é essencial para já não depender da boa vontade dos proprietários”, insiste Kleber Pagu.

Chegar a um acordo com os proprietários é o primeiro passo para os produtores. A arquitectura de São Paulo é muito propícia ao graffiti; muitos edifícios têm estas paredes laterais sem janelas, originalmente destinadas a serem ligadas a outro edifício. “Mas felizmente, nesta cidade murada, a continuidade é por vezes quebrada e torna-se uma tela em branco para grafite. Esta arte ocupa-a com mensagens resolutamente políticas”, diz Gisèle Beiguelman, professora de arquitectura na Universidade de São Paulo.

Por outro lado, desde 1988, uma lei proíbe a publicidade nestas paredes e obriga os proprietários a repintura-las de cinco em cinco anos. “O graffiti não lhes custa necessariamente mais e, pelo contrário, acrescenta valor ao edifício. A lei prevê mesmo uma redução fiscal para a escolha do graffiti”, acrescenta Toninho Vespoli. Apenas o suficiente para convencer a indústria imobiliária a preferir a arte a um simples trabalho de pintura.

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