Brasil: Sergio Camargo, o “homem negro da direita” ao serviço de Jair Bolsonaro

Nomeado pelo presidente brasileiro para chefiar a fundação que deve defender a cultura afro-brasileira, este provocador nato está a trabalhar para a destruir a partir de dentro.

A cabeça de ébano é perfeitamente lisa e a sua calvície é em si mesma uma declaração política. Para Sergio Camargo, 56 anos, que preside à Fundação Palmares – uma instituição fundada em 1988 para preservar e promover a cultura afro-brasileira – “não há nada mais ridículo para um homem negro do que estar orgulhoso do seu cabelo. Além disso, este antigo jornalista de São Paulo é um autoproclamado “inimigo do politicamente correcto”, tal como o seu campeão, o Presidente Jair Bolsonaro. Para os seus muitos detractores, pelo contrário, Camargo, que recusou o nosso pedido de entrevista, é um “negacionista”, “um homem negro com uma alma branca”.

Contudo, a posição que ocupa é altamente simbólica num país que era o destino preferido do tráfico de escravos, recebendo 45% dos seres humanos capturados no continente africano para serem utilizados como escravos nas Américas. Actualmente, a população negra do Brasil é a maior do mundo, atrás da Nigéria, mas bem à frente dos Estados Unidos. Os afro-descendentes do Brasil constituem 56% da população. Mas embora o racismo nunca tenha sido institucionalizado nesta nação há muito apresentado como uma “democracia racial”, a discriminação é flagrante.

A pobreza permanece em grande parte negra, tal como a violência: 75% das vítimas de homicídios são negras ou mestiças. Isto não impede Sergio Camargo de repetir que as desigualdades estruturais não existem. Quanto à escravatura, que foi abolida tardiamente em 1888, ele acredita que esta não teve apenas aspectos negativos. A prova? Hoje, os afro-descendentes vivem, segundo ele, “muito melhor no Brasil do que em África”. Todas estas são opiniões que “se opõem frontalmente” à missão da Fundação Palmares, segundo o juiz que, há dois anos, suspendeu a sua nomeação – um tribunal de recurso confirmou mais tarde a Camargo na sua posição.

Na rede social Twitter, onde é muito activo, a sua homepage é uma colecção de insultos contra o movimento negro, que ele descreve como “escória” e que, segundo ele, está a trabalhar para “vitimizar” os negros. Sergio Camargo apresenta-se como um “homem negro de direita”. No entanto, como observa a investigadora Flavia Rios, “a direita negra brasileira é moderada e não relativiza a escravatura ou o racismo. Camargo, por outro lado, é uma oposição radical a tudo o que a instituição que ele lidera representa”.

O nascimento da Fundação Palmares, que surgiu com o regresso à democracia após 21 anos de ditadura (1964-1985), foi de facto o resultado de uma exigência do movimento negro… que Jair Bolsonaro está a trabalhar para destruir. O presidente promoveu este homem para destruir as políticas públicas e os espaços institucionais conquistados pelos negros durante o regresso à democracia”, continua o académico. Ele precisava de um homem negro para fazer o trabalho”.

https://www.moz.life/mozbox/produit/bemugis-place-3-dias-santa-maria/

O chefe de Estado chegou ao ponto de escolher o filho de um militante histórico da causa negra, Oswaldo de Camargo, que é também poeta e escritor. Será que Sergio Camargo queria “matar o pai”? Os dois homens permitiram recentemente ser fotografados lado a lado, como se quisessem silenciar as más línguas. “Sergio exerce a sua liberdade à sua maneira, mas ainda tem um grande respeito por mim”, disse o seu pai numa entrevista rara, que lhe deu “alguns conselhos de leitura”. Sem resultado, obviamente…

A Fundação Palmares tornou-se um modelo perfeito para sabotar as instituições “a partir do interior”. O patrão caça “esquerdistas”, claro. Processado por “assédio psicológico”, já não pode demitir (ou nomear) ninguém. Isto não o impede de fazer mal. Sob a sua liderança, o processo, consagrado na constituição brasileira, de reconhecimento legal das comunidades estabelecidas nos quilombos, os territórios remotos onde os escravos fugitivos costumavam recuar, foi congelado.

Quanto à lista oficial de “personalidades negras que fizeram história”, foi purgada de cerca de 27 nomes (quase todos de esquerda), incluindo o do músico Gilberto Gil, um ícone da cultura brasileira! A Fundação Palmares agora só paga tributos póstumos, explicou o seu presidente, cuja metralhadora verbal não poupa Zumbi, líder do mítico quilombo de Palmares (que tinha 30.000 habitantes no século XVII), herói da resistência à escravatura e uma figura importante do panteão afro-brasileiro. “Um filho da puta”, diz Camargo simplesmente.

https://www.moz.life/mozbox/produit/mozbox-duo-naara-eco-lodge-3-dias-chidenguel/

Felizmente, não é ele mas o Parlamento que irá decidir este ano sobre a renovação ou não da lei de 2012 que introduziu quotas para estudantes negros nas universidades públicas federais. Ninguém ousa tocar nas quotas”, diz o antropólogo Jacques d’Adesky. Nem mesmo Jair Bolsonaro, que é contra eles. Porque ele sabe que deve a sua eleição a negros.

Segundo as estimativas deste especialista na questão racial, mais de metade dos afro-descendentes teriam votado em 2018 no candidato populista, apesar das suas recorrentes explosões racistas. O racismo não foi um critério nas eleições”, Jacques d’Adesky decifrou ainda mais. Os negros representam a maior parte dos membros das igrejas evangélicas, que são geralmente bolonistas. São conservadores da moral e votam de acordo com a orientação do pastor. Além disso, Bolsonaro foi o único candidato a falar de insegurança, que afecta principalmente os mais pobres.

Contacto: +258 84 91 20 078 / +258 21 40 14 21 – comercial@feelcom.co.mz

leave a reply