A Administração Nacional das Áreas de Conservação (ANAC) não tem dúvidas de que as fragilidades na Administração da Justiça continuam um dos grandes entraves no combate à rede complexa de caçadores furtivos. Só na província de Maputo foram registados, este ano, mais de 30 casos que resultaram na detenção de 43 pessoas.
A ANAC culpa todo o sistema da Justiça pela ineficiência no seguimento dos casos da caça furtiva no país. A instituição fala de inoperância para o descobrimento da raiz do problema, ou seja, os mandantes e os traficantes.
“A caça furtiva está estruturada em pelo menos cinco níveis. E praticamente nós temos acesso aos [caçadores] do nível um, os que vão ao terreno para caçar. São pessoas que não têm muitas informações. Eles só recebem orientações e instrumentos e vão à caça. O sistema de fiscalização e protecção da fauna bravia e da flora, nas áreas de conservação, assim como todo o sistema de aplicação da lei em Moçambique ainda está limitado à detenção, acusação e julgamento dos indivíduos do nível um”, lamentou Jorge Fernando, fiscal daquela entidade.
Há armas ilegais de alto calibre que circulam em Maputo. Jorge Fernando revelou ainda que as facilidades deixadas pelo Estado favorecem a que os caçadores sofistiquem os seus “modus operandi”, chegando a afrontar as autoridades com armas de alto calibre.
“Eles portam armas de grande calibre, armas capazes de derrubar um elefante e um rinoceronte com apenas uma bala. É um equipamento potente e a sua origem constitui um mistério. São armas que começamos a apreender desde 2015. Deve haver um circuito de fornecimento dessas armas que ainda não conseguimos descortinar. Os mandantes são do nível dois e três e raramente conseguimos chegar a eles. Se não chegamos a eles, automaticamente não chegamos aos traficantes, os que detém dinheiro. Achamos que há pessoas com um arsenal de armas em suas casas, alguns deles são conhecidos mas o sistema [da Justiça] não consegue manientar esses indivíduos”, narrou o fiscal Jorge, manifestamente entristecido.
A secretária de Estado da província de Maputo, Vitória Diogo, lamentou o incremento de casos da caça furtiva, o que tem impacto não só na sobrevivência de espécies, mas também na economia do país.
“O aumento da degradação da biodiversidade no país, acelerado pelas práticas impróprias, entre as quais o abate indiscriminado das espécies faunísticas, constitui ameaça e uma das grandes preocupações do Governo”, na medida em que “trazem consequências nefastas para a sustentabilidade da biodiversidade e para a economia nacional, inviabilizando alguns programas do Governo e, consequentemente o desenvolvimento”, introduziu a governante.
Vitória Diogo fez ainda a radiografia da situação da província de Maputo, sugerindo que os números que chegam às autoridades nem sempre são reveladores da gravidade da situação no terreno.
“A nossa província, à semelhança das restantes do país, continua a registar índices elevados de caça furtiva. A título do exemplo, de Janeiro a Setembro do presente ano, a Polícia de Protecção dos Recursos Naturais e Meio Ambiente reportou 33 casos”, revelou a secretária de Estado da província de Maputo, para quem em conexão com esses crimes, 43 indivíduos foram detidos sob acusação de caça furtiva.
Ademais, houve apreensão de instrumentos usados nessa actividade ilícita. “Isso mostra que devemo-nos preocupar com este mal. Sabe-se que no terreno há ocorrências de muitas situações ilegais, que não chegam ao nosso conhecimento. Mas todos nós sabemos que nos mercados informais há venda de carne de caça”, concluiu Vitória Diogo.
Segundo dados fornecidos pela ANAC, de Janeiro a esta parte, dois caçadores furtivos morreram afogados na Barragem de Corrumane, na província de Maputo, quando fugiam das autoridades de protecção, momentos depois de terem sido alegadamente surpreendidos a apanhar animais protegidos por lei.
Fonte: O país