Washington, D.C. – 28 de julho de 2025
A administração de Donald Trump está a conduzir uma iniciativa ambiciosa e controversa de paz para tentar pôr fim ao longo conflito no leste da República Democrática do Congo (RDC), um conflito que há décadas envolve também o vizinho Ruanda.
Com uma abordagem que mistura negociação política com acordos comerciais estratégicos, os EUA esperam garantir acesso a minerais essenciais para os setores tecnológico, energético e militar — especialmente cobalto, cobre, lítio, manganês e tântalo, vitais para carros elétricos, turbinas e inteligência artificial.
O Presidente Trump deverá receber em breve os chefes de Estado da RDC, Félix Tshisekedi, e de Ruanda, Paul Kagame, para selar um acordo de paz que classificou como um “triunfo glorioso”, com promessas de investimento americano a seguir-se à trégua.
Comércio, política e geoestratégia no mesmo palco
Segundo o professor Alex de Waal, diretor da World Peace Foundation, a Casa Branca está a promover “um novo modelo de construção de paz, que alia espetáculo populista à lógica de negócios”.
“Trump já aplicou este modelo na Ucrânia”, disse De Waal à BBC. “Quer o mérito político e garantir os minerais do Congo, que servem os interesses estratégicos dos EUA.”
Mas o académico reconhece que os Estados Unidos estão atrasados em relação à China, que já assegurou contratos minerais cruciais na RDC.
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Comprar um espaço para minha empresa.Até agora, as empresas norte-americanas mostravam-se relutantes em investir na RDC, devido aos riscos de segurança e ao receio de envolvimento com os chamados “minerais de sangue”, que financiam conflitos armados.
Com a nova abordagem, essa relutância poderá mudar.
Paz com contrapartidas: o preço do cobalto
O Departamento de Estado dos EUA estima que a RDC tenha 25 biliões de dólares em reservas minerais. Este potencial atrai a atenção de Washington, mas também levanta questões de soberania.
“Durante quanto tempo o Congo terá de ceder o seu cobalto aos EUA? Vinte ou cinquenta anos? Qual é o preço da paz?”, questiona a professora Hanri Mostert, especialista em direito mineiro na Universidade da Cidade do Cabo.
Ela teme que a RDC fique presa a contratos a longo prazo em troca de garantias vagas de segurança, tal como aconteceu noutros países africanos em acordos de “troca de recursos”, como o caso de Angola com a China.
Acordo prevê integração económica e coordenação militar
O acordo de paz, assinado por representantes da RDC e de Ruanda em 27 de junho, prevê a criação de um mecanismo de coordenação de segurança dentro de 30 dias e uma estrutura de integração económica regional ainda por negociar.
O objetivo é bloquear as vias ilícitas de comércio de minerais e promover parcerias e investimentos mútuos, visando o desenvolvimento e a estabilidade da região.
“Estamos a garantir muitos direitos mineiros para os EUA como parte do acordo”, afirmou Trump.
A RDC confirmou que está disposta a fornecer minerais críticos aos EUA em troca de segurança, segundo o porta-voz do governo, Patrick Muyaya.
Minerais, milícias e a guerra invisível
Um relatório recente da ONU afirma que o grupo rebelde M23, ativo no leste da RDC, tem contrabandeado grandes quantidades de minerais para Ruanda, onde são misturados com produção local e exportados em volume recorde.
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Anuncie aqui: clique já!Ruanda nega apoiar o M23, apesar das provas da presença de milhares de soldados ruandeses na RDC.
Para lidar com esta realidade, os EUA querem um acordo que impeça o contrabando e estabeleça um quadro de cooperação com investimentos transparentes.
Dois processos paralelos: EUA e Qatar na mediação
Enquanto os EUA se concentram na dimensão regional do conflito, o Qatar, aliado próximo de Washington, lidera negociações entre o governo congolês e o M23, que controla Goma, a capital regional.
Segundo o analista Jason Stearns, o Qatar age a pedido de Ruanda, que vê os EUA como pró-Congo. O Qatar tem fortes interesses económicos em Kigali, incluindo a construção de um novo aeroporto multimilionário e a intenção de adquirir 49% da companhia aérea nacional.
“É essencial que os dois processos estejam coordenados, para evitar que Ruanda negue responsabilidade sobre o M23 enquanto o conflito continua”, alerta Stearns.
Desafios pela frente: retirada de tropas e reconciliação duradoura
O acordo exige a criação de um cessar-fogo imediato e a assinatura de um acordo de paz global até 18 de agosto. Mas o caminho para a paz será longo, alertam os especialistas.
A retirada das tropas ruandesas e a neutralização da milícia FDLR, composta por responsáveis pelo genocídio de 1994, são pontos sensíveis. Ruanda exige a eliminação da FDLR antes de retirar, enquanto a RDC defende que ambas as ações devem acontecer ao mesmo tempo.
A paz exige mais do que tratados
“A paz constrói-se transformando a dor. Não basta diplomacia. É preciso diálogo, participação descentralizada e reconhecer os traumas históricos”, afirma Mostert.
Ela sublinha que o sucesso da iniciativa de Trump depende da sua capacidade de manter a pressão e assegurar que os interesses locais não sejam ofuscados pelos comerciais.