Moçambique: Rebelião no norte “em declínio” mas riscos não eliminados, segundo analistas

A rebelião no norte de Moçambique, iniciada há seis anos, “está a perder poder bélico” e a “declinar”, mas os riscos de “prolongamento do conflito” ainda não foram eliminados, segundo analistas em declarações.

A província de Cabo Delgado completou na quinta-feira (5 de outubro de 2017) seis anos desde o primeiro ataque de grupos armados no distrito de Mocímboa da Praia.

Em declarações à Lusa na quarta-feira, o investigador João Feijó, da ONG Observatório do Meio Rural, disse à Lusa considerar que “a insurgência [está] a perder gradualmente poder militar e capacidade logística, e alguns líderes”.

Feijó disse que as forças governamentais, juntamente com os militares do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), conseguiram expulsar os grupos armados das áreas que ocupavam em Cabo Delgado e travar o crescimento da insurreição.

“De um modo geral, todos [os contingentes militares] estão relativamente satisfeitos”, sublinhou.

João Feijó salientou que os rebeldes atingiram uma capacidade ofensiva que lhes permitiu paralisar o projeto de gás natural do consórcio da multinacional francesa Total quando atacaram a vila de Palma, em março de 2021, ocupando a sede do distrito de Mocímboa da Praia e localidades em vários distritos do norte de Cabo Delgado.

Os rebeldes, prosseguiu, “chegaram em viaturas blindadas que tinham capturado” às Forças de Defesa e Segurança (FDS).

Feijó referiu que a ação das forças governamentais moçambicanas e estrangeiras garantiu que os insurgentes fossem afastados das zonas ricas em recursos naturais, com destaque para o distrito de Palma, que vai acolher o complexo de transformação de gás natural liquefeito do consórcio TotalEnergies.

Apesar dos avanços no campo militar, continuou Feijó, o governo moçambicano “não reclama vitória”, porque sabe que os insurgentes podem “reinventar-se”, actuando em grupos mais pequenos e móveis.

“Eles continuam a atuar em segredo, de forma muito discreta, e ainda têm capacidades que ainda não foram completamente eliminadas”, sublinhou.

O investigador critica a falta de progressos na remoção das causas sociais, económicas e culturais que favoreceram o recrutamento de jovens por grupos armados em Cabo Delgado.

A gestão da situação em Cabo Delgado “não se limita apenas à pressão militar” e “a resposta [nas dimensões social, económica e cultural] é muito tímida e pouco convincente”, diz Feijó.

Borges Nhamire, investigador do Instituto de Estudos de Segurança (ISS África), defende que a insurgência está em “declínio” devido à ação das forças governamentais, mas a persistência das causas do conflito em Cabo Delgado ameaçam “o prolongamento da guerra”, mesmo que seja de “baixa intensidade”.

“O conflito está a diminuir, porque Moçambique tem muito mais capacidades militares, tem muito mais soldados no terreno, o conflito reduziu”, mas “as causas que facilitaram o surgimento do conflito no nordeste de Cabo Delgado não foram resolvidas”, comenta Nhamirre.

A hostilidade entre os principais grupos étnicos, a falta de formação profissional dos jovens e a ausência de apoio às actividades profissionais continuam, acrescenta.

O investigador do ISS África nota que as desigualdades sociais e económicas nas zonas afectadas pela violência em Cabo Delgado continuam a ser significativas, expondo os jovens ao recrutamento pelos grupos armados.

“Estas desigualdades foram agravadas com a descoberta dos recursos naturais, porque foram recrutadas pessoas de outras zonas de Moçambique e de outros países para a pesquisa e exploração desses recursos”, sublinha Nhamirre.

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